Gonorreia no Brasil

A gonorreia, causada pela Neisseria gonorrhoeae, consiste na segunda infecção bacteriana sexualmente transmissível mais comum no mundo, sendo responsável por altas taxas de morbidade e por elevados custos em saúde pública. No Brasil, o cenário epidemiológico da infecção acompanha os altos índices mundiais, estimando-se que a prevalência da gonorreia na população de 15 a 49 anos seja de aproximadamente 1,4%, e que a incidência na população em geral esteja em torno de 500 mil novos casos por ano.

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A gonorreia, causada pela Neisseria gonorrhoeae, consiste na segunda infecção bacteriana sexualmente transmissível mais comum no mundo, sendo responsável por altas taxas de morbidade e por elevados custos em saúde pública. No Brasil, o cenário epidemiológico da infecção acompanha os altos índices mundiais, estimando-se que a prevalência da gonorreia na população de 15 a 49 anos seja de aproximadamente 1,4%, e que a incidência na população em geral esteja em torno de 500 mil novos casos por ano.

A doença, quando não tratada de maneira correta, pode causar danos graves e até irreversíveis: doença inflamatória pélvica, gravidez ectópica, abortamento e até infertilidade. A Organização Mundial da Saúde estabelece uma série de critérios na busca da terapia mais adequada, tal como o da escolha do antibiótico, que deve ter eficácia superior a 95%. Além disso, nenhum agente antimicrobiano deve ser usado quando, em estudos de vigilância in vitro, mais de 5% das culturas gonocócicas demonstrarem resistência a esse antimicrobiano em questão.

A resistência da Neisseria gonorrhoeae aos antibióticos é uma preocupação mundial em saúde pública e tem aumentado rapidamente nos últimos anos, reduzindo as opções terapêuticas disponíveis. Tem-se identificado que, tão logo um medicamento venha a ser introduzido, a resposta ao tratamento começa a perder gradualmente o efeito devido à redução no nível de suscetibilidade da bactéria.

Atualmente, o gonococo é considerado um microrganismo multirresistente, devido ao desenvolvimento de resistências já identificas às sulfas, tetraciclinas, penicilinas, quinolonas e macrolídeos (inclusive azitromicina). Além disso, em várias regiões do mundo, já se constatou a emergência de suscetibilidade reduzida da Neisseria gonorrhoeae também à “última linha” das opções terapêuticas, as cefalosporinas – “supergonorreia”.

Recentemente, a OMS publicou um novo guideline para o tratamento da Neisseria gonorrhoeae no qual, devido aos elevados índices globais de resistência às fluoroquinolonas, não foi mais considerado o ciprofloxacino (fluoroquinolona) como uma opção viável. Desta forma, a recomendação terapêutica atual da OMS baseia-se na substituição do ciprofloxacino pela ceftriaxona ou cefixima (cefalosporinas de terceira geração) na terapia dupla, juntamente com azitromicina.

De caráter inédito, no ano de 2016 o Ministério da Saúde – em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina – realizou o estudo de vigilância da resistência in vitro do gonococo a diferentes antimicrobianos de abrangência nacional – sengono. Participaram da rede de monitoramento sete sítios, em diferentes localidades no País: Porto Alegre, Florianópolis, São Paulo, Belo Horizonte, Distrito Federal, Salvador e Manaus.

Além das resistências já bem estabelecidas às sulfas, tetraciclinas e penicilinas, constatou-se resistência emergente e em franca expansão ao ciprofloxacino, com taxas próximas e até superiores a 50% em todas as regiões do País. As cefalosforinas de terceira geração (cefixima e ceftriaxona) apresentaram altas taxas de suscetibilidade em todo o País, corroborando os dados da OMS e constituindo-se opções para o tratamento da gonorreia em substituição ao ciprofloxacino. A vigilância por meio do sengono continuará a ser realizada neste ano, com expansão para novos sítios ainda a definir. Desta forma, o País segue monitorando e fazendo seu papel de vigilância em saúde pública.

No que diz respeito ao tratamento da gonorreia preconizado pelo Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas de atenção integral às pessoas com IST, até o ano passado consistia na terapia dupla em que se associava o ciprofloxacino com azitromicina, exceto nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, onde recomendava-se a substituição pela ceftriaxona ou outro medicamento similar, por exemplo a cefixima, devido aos dados de estudos locais publicados sobre a resistência do gonococo ao ciprofloxacino.

Porém, com a identificação da resistência nacional do gonococo ao ciprofloxacino, a recomendação de tratamento foi alterada e será publicada em breve, com a atualização do PCDT-IST. Não somente nos três estados acima citados, como em todo o País, o tratamento da gonorreia consistirá na terapia dupla de ceftriaxona associada a azitromicina.

O diagnóstico e tratamento correto da gonorreia, assim como a vigilância da resistência aos antimicrobianos, constituem estratégias chaves para o combate do gonococo no País.

Adele Schwartz Benzaken é diretora do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, HIV/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde