Quem nunca bateu o dedinho do pé na quina da cama, queimou a mão na panela ou ficou com um galo? Acidentes domésticos acontecem diariamente. Às vezes, mais de uma vez ao dia. Que o diga quem tem criança em casa. Mas o que fazer nessas situações?
Há quem recomende colocar açúcar ou café na ferida para ajudar na cicatrização. Já para queimaduras, a receita popular é passar pasta de dente ou manteiga. No entanto, especialistas ouvidos pelo GLOBO pedem cautela ao seguir tais conselhos caseiros.
— São coisas que poderiam agravar o quadro — alerta Fábio Carra, clínico geral e emergencista do Hospital Nove de Julho, em São Paulo.
Mas então, o que fazer diante destes e outros acidentes caseiros comuns? Especialistas esclarecem abaixo as condutas para os principais acidentes leves e quais são os sinais de alerta para procurar atendimento médico.
Queimadura
Você encostou o braço no fogão, a mão na assadeira que acabou de sair do forno ou o dedo na chapinha e isso causou uma queimadura. O que fazer? A sabedoria popular recomenda colocar pasta de dente no local. Há ainda quem recomende colocar a mão em água fria, por exemplo. Clara de ovo, manteiga e pomada são outros recursos comuns. Alguma dessas medidas funciona?
Na verdade, não e, algumas, como a pasta de dente, o ovo, a manteiga ou a pomada, podem até piorar o quadro. Ao ser queimada, a pele perde a sua camada protetora e fica suscetível à entrada de microrganismos nocivos.
— Quando você tem uma queimadura, a pele está inflamada, e se você passar algum outro produto químico em cima, que não seja orientado por um médico que entenda da pele, como cirurgião plástico ou dermatologista, isso pode causar uma abrasão, inflamar e lesar mais ainda essa pele. Então quanto menos produto passar sem orientação, melhor — afirma o médico Humberto Bogossian, clínico geral do Hospital Israelita Albert Einstein.
A água fria até entra na recomendação, mas como água corrente para lavar o local junto com sabonete para observar a extensão da queimadura. Isso, por si só, já pode ajudar a aliviar a dor de queimaduras superficiais, pois diminui a temperatura da lesão. Mas não é preciso mergulhar o dedo ou a mão em um recipiente com água, por exemplo. Após a higienização, é preciso avaliar a extensão do machucado.
— Se for muito grande, tem que procurar atendimento — orienta Carra.
A formação de bolha ou a falta de integridade da pele também indicam queimadura de maior intensidade e necessidade de procurar um serviço de emergência. O local afetado (olhos, região íntima, mão e pés são áreas mais sensíveis) e o agente causador da queimadura também influenciam. O óleo quente, por exemplo, tende a causar queimaduras mais graves.
Se for apenas uma queimadura superficial, basta lavar e esperar a pele se recuperar. Nesse período, evitar a exposição ao sol para não ficar com cicatriz e hidratar o local, pode ajudar na recuperação.
Corte
O pó de café e o açúcar são os “remédios caseiros” mais comuns para cortes. Segundo seus defensores, isso ajudaria a estancar o sangue. No entanto, médicos ouvidos pelo GLOBO absolutamente contraindicam tais condutas.
— Isso pode até complicar. Quando você joga um produto desse, que pode favorecer o crescimento bacteriano, em uma feria aberta, você pode causar infecção — pontua Bogossian.
A primeira recomendação é lavar o corte em água corrente com água e sabonete — o detergente deve ser evitado pois tende a ressecar mais a pele. Em seguida, avalie a extensão e profundidade do corte. Cortes muitos profundos, extensos ou que não param de sangrar, precisam de ponto.
— Dependendo do local (do corte), tem risco de pegar outras estruturas, como tendão e músculo, o que demanda um atendimento mais urgente — diz Carra.
Se for apenas um corte superficial, com pouco sangramento, após lavar o local, a recomendação é comprimir com gaze ou pano limpo ou ainda usar um curativo adesivo para parar o sangramento.
Bogossian ressalta que dependendo do que causou o corte, é importante checar se a vacinação anti-tétano está em dia. Se não estiver, o ideal é procurar um serviço de saúde para se vacinar.
Ralado
Seu filho caiu na rua – ou no futebol – e ralou o joelho. O que fazer? Neste caso, a recomendação é bem parecida com a do corte: lavar o local com água corrente e sabonete neutro. Se for um ralado profundo, procure atendimento médico de emergência. Já para os ralados superficiais, que são os mais comuns, após higienizar o local, o ideal é não tampar o ralado porque um curativo nessa região pode causar dor e atrapalhar a cicatrização.
Bater o dedinho na quina
Bater o dedinho na quina do móvel talvez seja uma das dores agudas mais inesperadamente desagradáveis, não é mesmo? Mas a verdade é que qualquer pancada dói.
A primeira coisa a ser feita nestes casos é tentar mexer o local afetado – principalmente se for o dedinho que “encontrou” a porta – para garantir que não há fratura. Se houver dificuldade de mover o membro, inchaço ou desvio (o dedo não está na posição normal, por exemplo), é necessário procurar atendimento médico.
Se o local estiver apenas doendo da pancada, mas for possível movimentar o membro, a orientação é fazer uma compressa com gelo. Um analgésico comum também pode ajudar com a dor.
— No primeiro dia, pode fazer compressas de 10 a 15 minutos, umas quatro a cinco vezes por dia no lugar da pancada. Isso vai diminuir o hematoma e aliviar a dor. Só precisa tomar cuidado para não pôr o gelo direto na pele, pois pode queimar — orienta o clínico geral do Hospital Albert Einstein.
Galo na cabeça
O galo na cabeça também ocorre após uma pancada, mas por se tratar de uma região mais sensível, merece um capítulo à parte.
— A primeira coisa é observar se a pessoa ficou mais sonolenta. Desmaio e vômito também são sinais de alarme para procurar um pronto-socorro. E pessoas que tomam remédios para afinar o sangue, como anticoagulantes e aspirina, sempre devem procurar o pronto-socorro após uma pancada na cabeça — avalia Carra.
Se foi apenas uma batida leve, a orientação é realizar uma compressa de gelo no local, o que ajuda no processo inflamatório e a diminuir o tamanho do galo – sempre tomando cuidado para o gelo não ficar diretamente em contato com a pele -, e observar. Um analgésico comum também pode ajudar a com a dor.
— O ideal é observar o comportamento da pessoa que bateu a cabeça até o dia seguinte ao acidente. Se for uma criança e ela estiver se alimentando bem, brincando, sem queixa de dor de cabeça, tudo certo — diz Bogossian.
— Sonolência, confusão mental, desmaio e vômito inexplicável são sinais de alerta — completa Carra.
Cisco no olho
Se um corpo estranho, como uma pedrinha, cílio, poeira ou areia, entrar no olho, a recomendação é não coçar – isso pode machucar a córnea – e lavar preferencialmente com soro fisiológico. Se não tiver soro, pode ser água potável ou ainda água corrente. Um colírio hidratante também pode ajudar.
— Se após lavar, ainda continuar incomodando, a recomendação é procurar atendimento médico. Hematoma, olho muito vermelho, alteração visual ou dor também são sinais de alerta — avalia Bogossian.
Sangramento nasal
A crença popular durante um sangramento nasal é colocar a cabeça para trás até o sangramento parar. Na verdade, fazer isso não vai fazer o sangramento parar, só vai fazer com o sangue escorra por dentro da garganta em vez de para fora do nariz. Além disso, isso aumenta o risco de vômitos ou engasgos.
O ideal é justamente o oposto: colocar a cabeça para frente e comprimir a parte de cima nariz.
— Colocar um gelinho coberto com uma gaze em cima do nariz e deixar comprimindo o nariz por uns 10 minutos ou colocar uma gaze gelada um pouquinho por dentro do nariz pode ajudar a parar o sangramento, pois o gelo causa uma vasoconstrição — diz o clínico do Hospital Albert Einstein.
Se o sangramento foi intenso ou se for leve, mas não parar após cerca de 15 a 20 minutos, é preciso procurar atendimento médico.
Intoxicação
Provavelmente você já ouviu que em caso de intoxicação por produtos químicos, a pessoa deve beber leite, pois a bebida “cortaria os efeitos tóxicos”. No entanto, isso é altamente contraindicado. Médicos são categóricos em dizer que isso não apenas é um mito, como pode piorar o quadro, pois o leite aumenta a absorção de algumas substâncias tóxicas.
Tomar água ou tentar induzir o vômito também são contraindicados. A água pode potencializar os danos causados pela substância ingerida e o vômito pode lesionar o esôfago ou causar broncoaspiração.
Nestes casos, o ideal é procurar atendimento médico imediatamente. Ligar para o Samu (192) ou para o Corpo de Bombeiros (193) também pode ajudar no socorro inicial até a chegada ao hospital, pois a orientação irá variar de acordo com a substância ingerida, o tempo e a quantidade.