A Associação Paulista de Medicina (APM) promoveu, na última quarta-feira, 16 de abril, webinar com o tema “A crise na saúde suplementar e soluções viáveis no seu enfrentamento. Até onde a judicialização prejudica a Saúde?”. O encontro contou com a apresentação do presidente da entidade, Antonio José Gonçalves, que destacou a relevância dos assuntos.



“É uma grande satisfação estar com vocês para tratar de questões tão importantes, como a crise na saúde suplementar. Vamos discutir sobre isso para ver o que está acontecendo de verdade. Além disso, abordaremos como a judicialização prejudica a Saúde. Hoje, o médico pede procedimento, a operadora nega, a família recorre à Justiça e o juiz acaba mandando mais do que o médico, sem saber a indicação e os critérios de internação”, destacou.
A moderação do webinar ficou com os diretores de Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências da APM, Álvaro Nagib Atallah e Paulo De Conti, que agradeceram a participação dos convidados. “O setor da saúde suplementar é extremamente complexo, porque com lida várias vertentes ao mesmo tempo. Temos observado, nos últimos anos, insatisfação por parte de médicos, hospitais, beneficiários e operadoras”, explicou De Conti.
Crise na saúde suplementar
A primeira palestra foi ministrada pelo ginecologista Ramiro Teixeira Hernandez. Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto, o médico iniciou sua apresentação agradecendo o convite e demonstrando satisfação em participar deste encontro. Logo em seguida, falou sobre a atual situação das operadoras de planos de saúde, a sinistralidade e os desafios futuros, como o envelhecimento populacional, incorporação tecnológica, judicialização, hiper-regulação da ANS e frente a valores econômicos, nacionais e até geopolíticas internacionais.
O crescimento de 12% no número de beneficiários, segundo a ANS, demonstra uma migração do sistema público para o privado. “No mínimo, denota uma crise na saúde pública, porque as pessoas estão saindo do serviço público em busca de um sistema que contemple mais as suas necessidades. Particularmente, depois da Covid-19, as pessoas ficaram ainda mais preocupadas”, explicou o palestrante.
Hernandez reforçou que, quando observada a evolução dos beneficiários nos últimos cinco anos, por faixa etária, é possível verificar grande incremento de pessoas na faixa etária de 40 anos, além de pacientes muito idosos – número relevante na interpretação do custo assistencial que vai gerar. “Quando olhamos, especificamente, para os beneficiários acima dos 60 anos, notamos crescimento de mais de 1,2 milhão de pessoas, que vão corresponder a 15% da massa de clientes. Quando olhamos para o cenário nacional, os três maiores centros são Minas Gerais, Rio Janeiro e São Paulo, correspondendo a 57% de toda clientela da saúde suplementar. Então, nos três estados temos mais da metade dos clientes”, explicou.
Segundo o médico, as informações contábeis enviadas à ANS demonstraram lucro líquido de R$ 11,1 bilhões em 2024, representando aumento de 271% em relação ao ano anterior. “Esse resultado equivale a 3,16% da receita total acumulada no período, aproximadamente R$ 350 bilhões. Ou seja, para cada R$ 100 de receita, o setor auferiu cerca de R$ 3,16 de lucro ou sobra. Então é uma operação muito no limite operacional. Quando contempla as operadoras que estão no mercado, você percebe que, desde 2021, um terço está fechando no vermelho. Não estou dizendo isso em defesa da operadora, porque ela também tem muita coisa para melhorar e não está sendo esse mar de rosas que anda sendo publicado.”
De acordo com levantamento apresentado pelo palestrante, 41% das indústrias não adotam estratégias para reduzir a sinistralidade, enquanto 72% afirmam implementar a coparticipação como estratégia para mitigar custos. “A redução das ocorrências de sinistralidade é viável com a prevenção de doenças, o enfrentamento da desinformação e o acompanhamento periódico da situação de Saúde do trabalhador”, acrescentou o especialista, que concordou que a saúde suplementar está em crise.
Impacto da judicialização no setor da Saúde
Sobre o segundo tema abordado no webinar, o diretor adjunto de Defesa Profissional da APM, Marun Davi Cury, iniciou falando que trabalha com saúde suplementar desde que entrou na entidade, no fim de 2011. “Tenho convívio grande com prestadores, hospitais, clínicas e operadoras. O sistema de saúde suplementar é um pacto intergeracional – os mais novos pagam pelo que os mais velhos usam. Eles precisam administrar corretamente para que o maior número de pessoas seja atendido. Nós, da APM, fomos os primeiros – em São Paulo e no Brasil – a levantar os problemas de fraudes, desperdícios e judicialização. Tanto que fomos convidados a trabalhar junto do Conselho Nacional de Justiça e fizemos vários fóruns para discutir esses problemas tanto na saúde pública quanto na suplementar”, esclareceu.
Em linhas gerais, a judicialização na Saúde é a garantia fundamental do indivíduo de buscar no Poder Judiciário a efetivação do direito à Saúde, diante da omissão ou da negativa do Estado e dos planos de saúde em prestar assistência médica adequada.
Para Marun, a judicialização excessiva pode comprometer o sistema de saúde pública, ameaçando o acesso aos serviços básicos de mais de 150 milhões de brasileiros. “Da mesma forma, quando um paciente busca o amparo judicial para obter um medicamento ou procedimento específico, gera um aumento nos gastos das operadoras de saúde”, continuou.
Por fim, o diretor da APM falou, entre algumas alternativas, que a intervenção do Judiciário busque o equilíbrio entre direito à Saúde, respeito aos ditames constitucionais, respeito ao código de Defesa do Consumidor, diálogo mais efetivo entre as partes envolvidas, busca de novas ferramentas jurídicas, mediação e conciliação, formatação de protocolos de assistência farmacêutica mais amplos, informação ao cidadão e fortalecimento das ouvidorias de Saúde.


Fotos: Reprodução Webinar APM