70% dos médicos identificam Covid-19 longa nos pacientes

A cada dez médicos, sete afirmam que têm constatado na prática diária casos de pacientes com sequelas após a infecção pelo SARS- -CoV-2.

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A cada dez médicos, sete afirmam que têm constatado na prática diária casos de pacientes com sequelas após a infecção pelo SARS- -CoV-2. Em um momento em que a pandemia dá sinais de retração, as preocupações se voltam não somente à demanda reprimida, mas aos casos de Covid-19 longa, como estão sendo identificadas as ocasiões em que há sintomas que acompanham o paciente mesmo após a recuperação da fase aguda da doença.

Entre as principais condições identificadas pelos médicos, estão: dor de cabeça incessante, fadiga e dores no corpo (50%); anosmia e ageusia (39%); problemas cardíacos e trombose (23%); sequelas neurológicas e acidentes vasculares cerebrais (22%); fibrose pulmonar (18%); e sequelas renais (5%). Há ainda relatos de alopecia, fadiga, tosse crônica e problemas de memória.

Os dados foram retirados da pesquisa “Percepção dos médicos sobre o atual momento da pandemia de Covid-19”, realizada pela Associação Paulista de Medicina (APM) e pela Associação Médica Brasileira (AMB), entre os dias 21 e 31 de janeiro deste ano, com 3.517 profissionais de todo o País, pela ferramenta SurveyMonkey. A margem de erro é de dois pontos percentuais.  

Segundo a experiência dos médicos brasileiros, em 36% das vezes, os sintomas surgem em até um mês, enquanto em 26% dos casos, em até três. Há relatos, também, de sequelas que se manifestam em até seis (8%) ou nove meses (2%) e, em menor escala, até depois de um ano.   

Em relação à permanência das condições, os médicos indicaram que em 11% das vezes, as sequelas são permanentes. Outros 12% apontam que em até três meses os seus pacientes têm apresentado melhora. Metade dos respondentes, porém, afirma que os efeitos adversos da síndrome pós-Covid, como também tem sido chamada, têm se mantido entre três meses e um ano. 

Grande parte dos casos (43%) tem prejudicado de forma branda as atividades e a qualidade de vida dos pacientes, mas há também quem esteja sofrendo intensamente (27%). 

Covid-19 longa ou síndrome pós-Covid

A maioria das pessoas que desenvolvem a doença se recupera completamente em até duas semanas, mas de 10% a 20% dos indivíduos, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), experimentam uma variedade de efeitos a médio e longo prazo após a recuperação. 

Segundo a entidade global, ainda não há nenhuma medicação específica para tratar da síndrome pós-Covid, embora existam dados animadores em relação a uma abordagem holística, que foque na reabilitação dos doentes. 

No pós-Covid, vemos as manifestações que podem atingir os sistemas pulmonar e cardíaco, a parte neurológica, músculos e articulações, além de todas as questões ligadas à saúde emocional. Essas pessoas precisam ser diagnosticadas e encaminhadas para tratamentos específicos de reabilitação, além de receber orientações sobre dieta, prática de atividade física e estilo de vida”, explica Flávio Bitter, diretor-gerente da Bradesco Saúde. 

A OMS também esclarece que pesquisas sobre a relação entre vacinas e a Covid-19 longa ainda estão sendo realizadas. Assim, as imunizações são, antes, formas de prevenção da própria infecção em si.  

Impactos na saúde mental 

Em março, o periódico The Lancet publicou um importante estudo observacional que relacionou os casos graves de Covid-19 com a morbidade em saúde mental, acompanhando pacientes de seis países (Dinamarca, Estônia, Islândia, Noruega, Suécia e Reino Unido). 

Das 247.249 pessoas avaliadas, 9.979 foram diagnosticados com Covid-19 durante o estudo. De maneira geral,este grupo apresentou maior prevalência de sintomas de depressão (18%) e pior qualidade de sono (13%) que os demais. Entre os pacientes que tiveram a forma grave da doença, o cenário é ainda pior. Quem ficou acamado por sete dias ou mais esteve persistentemente sob maior risco de sintomas de depressão (61%) e ansiedade (43%) do que os que não foram infectados pelo coronavírus.  

Desta forma, o grupo interpretou que os casos de Covid-19 estão associados aos sintomas de saúde mental a longo prazo. “Essas descobertas exigem maior vigilância no desenvolvimento de adversidades na saúde mental entre pacientes que tiveram uma fase aguda da doença”, diz o artigo. 

Recuperação 

Notando o prolongamento dos sintomas, muitas instituições universitárias e de Saúde criaram, nos últimos dois anos, programas de reabilitação para cuidar de pacientes que se recuperaram de Covid-19. Assim como planos de saúde têm referenciado redes com esse intuito. 

Há hospitais, por exemplo, que possuem serviços especializados nestes cuidados, dedicados tanto aos portadores de Covid longa, quanto aos indivíduos que tiveram sequelas após muitos dias acamados ou àqueles que viram o agravamento de outras doenças pré-existentes.

Linamara Rizzo Battistella, presidente do Conselho Diretor do Instituto de Medicina Física e Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC/FMUSP), disse ao jornal O Globo, em 2 de março deste ano, que a reabilitação é o próximo desafio do Brasil na pandemia. 

“É preciso dar reabilitação ajustada à necessidade de cada paciente. Caso contrário, vamos ter uma população inteira demandando cuidados permanentes e fora da condição produtiva. O hospital salva a vida, mas é a reabilitação que devolve essa vida para a sociedade”, destaca Linamara, que também é idealizadora da Rede de Reabilitação Lucy Montoro.

No HC, segundo a especialista, a maioria dos casos é de pacientes encaminhados de hospitais e tem final feliz. 

Cerca de 8% dos pacientes, porém, seguem com limitações importantes em suas rotinas. Apesar de muitos dos sintomas não terem, ainda, explicação científica, essas instituições podem trabalhar com um vasto arsenal terapêutico para tratá-los. 

A própria Rede de Reabilitação Lucy Montoro disponibiliza, em seu site, o documento “Apoio ao Autocuidado em Reabilitação após a Covid-19”, oferecendo orientações básicas sobre exercícios e aconselhamento para adultos que passaram por tratamento da doença em hospitais.