Palestras internacionais abrilhantam XXXVI Congresso Brasileiro de Cefaleia

A cidade de Santos foi sede do XXXVI Congresso Brasileiro de Cefaleia e XVII Congresso de Dor Orofacial - realizado nos dias 28 e 29 de outubro, reunindo uma série de palestrantes nacionais e internacionais.

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A cidade de Santos foi sede do XXXVI Congresso Brasileiro de Cefaleia e XVII Congresso de Dor Orofacial – realizado nos dias 28 e 29 de outubro, reunindo uma série de palestrantes nacionais e internacionais. E para iniciar a programação científica, o médico italiano Fábio Antonaci, ministrou uma das aulas na manhã do dia 28.

Ele iniciou a apresentação realizando um tributo a Ottar Sjaastad, neurologista norueguês nomeado Cavaleiro da 1ª classe da Real Ordem Norueguesa de São Olavo por conta de seu trabalho em prol da Medicina. Sjaastad faleceu no dia 30 de agosto deste ano, deixando como legado pesquisas e descobrimentos sobre dor de cabeça – reconhecidas por especialistas ao redor de todo o mundo.

O palestrante relembrou que o professor era um homem de características marcantes, rigoroso e afiado, mas com uma capacidade extraordinária de ensinar seus alunos através de diferentes métodos, contribuindo na percepção de como abordar o paciente e dar a ele determinados diagnósticos. De acordo com Antonaci, Ottar Sjaastad pode ser classificado como um gigante mestre de sua área de atuação.

“Sjaastad é rememorado pela sua simplicidade e honestidade, sempre honrado pelos seus pupilos. Quando você tem um cientista focado em estudar a cefaleia, ele te coloca para pensar sobre o ato de interagir com os demais e de identificar um método para encontrar o problema, mantendo a perspectiva de melhorar a qualidade de vida do paciente. Permite uma gama de possibilidades de diagnóstico e contribui para te relembrar que existem diferentes abordagens científicas. Por isso, posso afirmar que Sjaastad foi um grande professor para mim”, descreveu o médico, em palavras emocionadas.

Conceitos

Após a homenagem, Fábio Antonacci descreveu aos congressistas que sua missão era apresentar as principais diretrizes da Academia Europeia de Neurologia no que tange às causas da dor de cabeça provocada pelo uso excessivo de medicamentos – um problema crescente e cada vez mais apresentado nas queixas de pacientes.

Conforme a explicação do especialista, é necessário entender os motivos que levam a esta condição, de modo que os critérios de diagnóstico se dividem entre dores de cabeça que acontecem por 15 dias seguidos no mês, em pacientes com quadros semelhantes já pré-existentes e que regularmente utilizam de forma excessiva medicamentos que podem ser tomados para o tratamento de dor aguda, ou sintomática por mais de três meses.

Não obstante, é fundamental destacar que há dois subtipos de dor de cabeça ocasionada pelo uso excessivo de medicamentos. O primeiro deles é a ingestão de medicamentos por 10 ou mais dias por mês – neste caso os mais fáceis e populares de serem encontrados nos pacientes, se dividindo entre o uso excessivo de ergotamina, triptanos e opioides; e combinação exagerada de analgésicos para dor de cabeça. Além disso, também há a cefaleia atribuída a múltiplas classes de medicamentos utilizados em excesso individualmente, não especificadas ou não verificadas e por uso demasiado diretamente atrelado a outras medicações.

O outro subtipo se classifica como a ingestão de medicamentos por 15 ou mais dias por mês, sendo a cefaleia causada por uso exagerado de medicamentos não-opioides, como o Paracetamol, medicamentos não esteroides e anti-inflamatórios, levando a um dilema paradoxal – ao passo que os especialistas buscam entender se é pelo fato de os quadros de migrânea piorarem que os pacientes passam a tomar mais medicamentos, ou se eles ingerem mais medicações (por motivos diversos) e isso contribui para a piora dos casos de dor de cabeça.

“Fatores associados à medicação excessiva aguda em pessoas que sofrem de migrânea são resultados de 2017 publicados no estudo de sintomas e tratamentos de enxaqueca na América. Sendo assim, apontam que 13.651 pacientes têm enxaqueca causada pelo uso excessivo de medicamentos”, apontou o palestrante, indicando que o índice de pessoas acometidas pela dor de cabeça ocasionada pelo consumo de remédios é alto.

Diretrizes

Dando continuidade à apresentação, o especialista salientou que para entender o contexto do que estava sendo falado, a Academia Europeia de Neurologia desenvolveu uma série de diretrizes e questionamentos que contribuem para estudar os casos analisados. Segundo Antonaci, as diretrizes apontam que a dor de cabeça ocasionada pelo uso excessivo de medicamentos é, à princípio, evitável.

Sendo assim, uma forma importante e fundamental para contribuir com a prevenção deste problema é aumentar o conhecimento da população geral e dos profissionais da Saúde acerca do assunto, no sentido de estudar a relação entre a frequência na ingestão de medicamentos para tratar episódios de dores de cabeça agudos e o possível aumento nos dias em que ocorre esta dor.

Não obstante, a distribuição de folhetos informativos e educacionais sobre a relação potencial entre o uso frequente de medicamentos para dor e a transição de dores de cabeça episódicas para crônicas podem ser eficientes para prevenir casos de migrânea por uso excessivo de medicamentos em pacientes com risco de enxaqueca – de modo que estes devem ser acompanhados em um curto espaço de tempo pelos seus respectivos clínicos gerais ou neurologistas, sendo ideal que o período de acompanhamento seja realizado a cada 3 a 6 meses.

“Contudo, há evidências insuficientes de que a terapia médica preventiva em pacientes com enxaqueca frequente pode prevenir a transição do caso em episódico para crônico e o desenvolvimento de casos de dor de cabeça por consumo abundante de medicamentos. A questão da terapia preventiva pode prevenir a cronificação, sendo clinicamente relevante. No entanto, pesquisadores são encorajados a conduzir aleatoriamente estudos controlados sobre este assunto”, explicou o médico.

Em relação à Medicina preventiva, medicamentos como Topiramato, toxina onabotulínica A ou um anticorpo monoclonal podem ser eficientes em pacientes com enxaqueca crônica ocasionada por uso excessivo de remédios, todavia, é importante salientar que no caso do Topiramato, o medicamento é contraindicado em mulheres com potencial de gravidez, já que pode ser prejudicial ao feto.

Na prática clínica, o aviso para parar de consumir excessivamente os medicamentos deve ser providenciado antes mesmo do tratamento começar, para assim já terem controle da prática a qual serão submetidos. Demais medicações, como bloqueadores-beta, flunarizina ou amitriptilina, podem ser utilizadas, ainda que sua eficácia não tenha sido indicada em testes aleatórios de controle de placebo. 

Tratamentos

A retirada de medicamentos agudos do consumo abusivo é eficaz, diretamente associada às melhorias nos custos do sistema de saúde, na qualidade de vida e na redução de casos de depressão e ansiedade. Contudo, ainda há incertezas sobre a medicação preventiva, se ela deveria ser adicionada precoce ou tardiamente, de modo que a Ciência ainda busca por mais informações.

Antonaci salientou também que a retirada de medicamentos que podem ocasionar quadros de dores de cabeça em pacientes pode vir carregada de uma série de sintomas. “Sabemos que há alguns tipos de medicamentos que podem ser utilizados quando o seu paciente está sofrendo uma remoção dos demais medicamentos, podendo causar insônia, náusea e tremores. Por isso, a resposta ao tratamento pode ser muito lenta.”

De acordo com o especialista, a taxa de recaída após começar um tratamento bem-sucedido ainda é relativamente alta, o que garante a identificação de fatores de risco, bem como permite reconhecer qual acompanhamento regular é o mais adequado para os diferentes pacientes. Sendo assim, monitorar o consumo das medicações – através de prontuários ou aplicativos – é, provavelmente, a forma mais eficiente de se ter controle.

Portanto, é válido reforçar que o tratamento contínuo realizado com o medicamento OnabotulinumtoxinA, monitoramento das medicações ingeridas e psicoterapia tende a ter um efeito positivo a curto prazo, capaz de prevenir eventuais recaídas, devendo ser utilizado com pacientes que se encaixem nos quadros de cefaleia por consumo excessivo de remédios.

“Podemos concluir, então, que pacientes com casos mais complexos de dor de cabeça ocasionada por uso excessivo de medicamentos devem ser tratados por um time multidisciplinar de neurologistas, especialistas em dor e psicólogos de comportamento. O encerramento no uso dessas medicações pode ser realizado de forma ambulatorial, em unidades de cuidados diários ou em ambientes de internações. Todas as configurações têm uma taxa de sucesso parecida, por isso, estará nas mãos do médico decidir se o paciente continuará o tratamento no hospital ou se poderá seguir em casa”, finalizou Antonaci.

Fotos: Marina Bustos