APM visita projeto piloto da Vila Reencontro, para pessoas em situação de rua

A Associação Paulista de Medicina criou um grupo de trabalho para debater o tema e tem procurado contribuir no sentido de levar assistência a essa população

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Conforme publicado em especial da Revista da APM, o avanço da pandemia de Covid-19 foi um dos fatores fundamentais para a elevação do desemprego e, consequentemente, do aumento drástico do número de pessoas em situação de rua. Este preocupante problema chama a atenção de autoridades, que vêm ativamente buscando por alternativas a fim de resolver ou minimizar a questão.

Desta maneira, a Associação Paulista de Medicina criou um grupo de trabalho para debater o tema e tem procurado contribuir no sentido de levar assistência à população que se encontra nas ruas. E na última terça-feira, 25 de outubro, a APM pôde visitar, em primeira mão, o projeto piloto do programa habitacional temporário chamado Vila Reencontro – iniciativa da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo, formado por de casas modulares.

Estiveram presentes o presidente da Associação, José Luiz Gomes do Amaral, e o diretor de Responsabilidade Social, Jorge Carlos Machado Curi; o secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo, Carlos Bezerra Júnior; o ex-vereador de São Paulo Gilberto Natalini; e os membros do Consultório na Rua, do Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto, Marta Regina Marques, gestora do projeto, e Marivaldo da Silva Santos, agente de Saúde.

A Vila Reencontro será instalada no terreno em que ficava o antigo Detran/SP – próximo à estação Armênia do metrô – e tem previsão para ser entregue em dezembro deste ano. De acordo com Bezerra, o projeto é diferenciado, pois irá utilizar a antiga estrutura do prédio para abrigar a Secretaria de Assistência Social e Cidadania, contribuindo para os acompanhamentos e diferentes atividades para os futuros moradores da Vila, como uma unidade do Bom Prato e uma Unidade Básica de Saúde (UBS).

Objetivos

A Vila Reencontro busca abrigar casais e famílias, priorizando aquelas em que as líderes são mulheres com filhos e que estão nas ruas há dois anos ou menos. A estruturação irá contar com 350 casas modulares, sendo que a primeira inserção de pessoas será em, aproximadamente, 150 delas. O local conta com sistema de água encanada e o intuito é levar o projeto para outras regiões de São Paulo – inicialmente, já há cinco outros terrenos em análise.

As casas modulares estão dispostas em estruturas semelhantes a contêineres, e outros dois modelos foram estudados antes de ser tomada a decisão final. No entanto, eles não eram atrativos, já que um era uma construção elaborada com materiais recicláveis, com um isolamento térmico interessante, mas sem resistência suficiente para aguentar fortes ventos ou tempestades; e o outro era constituído por um material à base de gesso, que também não demonstrou eficiência, já que se deteriora muito rapidamente.

“Por essa razão, o formato de contêiner acabou sendo escolhido, por conta do isolamento térmico e acústico e por tudo aquilo que ele proporciona. Temos muitas vantagens nesse modelo de construção, como o fato de não ter contato com o solo e também por ser móvel, sendo possível pegar e transferir para outro lugar. Além da mobilidade, a construção também é rápida e conta com um sistema de plug and play, então a água e o esgoto são em forma de encaixe”, explicou o secretário.

Não obstante, o interior do contêiner também foi pensado para fornecer conforto àqueles que habitarão o espaço. O material é revestido por uma placa dupla e o meio conta com uma chapa de vidro isolante. Ademais, uma das maiores reivindicações da população em situação de rua diante dos movimentos sociais é a necessidade de um banheiro com chuveiro, visto que esta é uma maneira de contribuir para a preservação da privacidade e da individualidade de cada um, por isso, o módulo busca atender essa demanda.

Solidariedade

Esta é a primeira vez que um projeto social deste porte, utilizando tal estrutura, é realizado no País. Bezerra relembrou que este tipo de solução e modelo são muito comuns na construção de hospitais, como o de Piracicaba, já que o forte do mercado com esse tipo de material é justamente a área da Saúde. Para ele, a solução é completamente eficiente, já que reduz custos e aumenta a velocidade de construção – salientando que o projeto só não foi entregue até o momento por conta do atraso na liberação do laudo de avaliação do terreno.

Sobre o tempo em que as famílias acolhidas têm que estar nas ruas para receberem prioridade na assistência – de no máximo dois anos – os especialistas afirmaram que é pelo fato de este ser o período mais fácil e rápido de recuperar a população, tirando-a da rua e controlando a situação, já que quem está nas ruas até este período de tempo ainda tem uma ideia de pertencimento e identidade, enquanto quem está há mais tempo já perdeu muitas coisas, tendo uma associação muito maior com o consumo de drogas e problemas psiquiátricos.

“Começar com pessoas que estão até dois anos em situação de rua foi muito assertivo. Já foi comprovado várias vezes e fizemos vários trabalhos que demonstram que quanto mais tempo a pessoa ficar em situação de rua, mais ela passa a perder a sua identidade individual, o que dificulta muito em trazê-la de volta”, esclareceu Marta Marques.

Para garantir o monitoramento dos indivíduos que morarão temporariamente nas casas modulares, serão contratados profissionais que analisarão os avanços e fornecerão recursos e suporte que preservem a integridade e autonomia. Ainda, a integração de um espaço para a Secretaria do Trabalho no local também será fundamental para auxiliar na busca por empregos, já que é esperado que as famílias fiquem na Vila Reencontro por até 18 meses, gerando rotatividade.

O secretário de Assistência Social esclareceu que cada caso será analisado integralmente, visando atender àqueles que mesmo após o período indicado precisem passar mais tempo no local. “Quem está de fora pode não enxergar a maneira que o projeto vem sendo construído, mas é preciso ver na perspectiva de se tirar as pessoas da situação de rua, diminuindo vulnerabilidades e extremos riscos. Sendo assim, é fundamental o apoio de todas as esferas públicas, já que isso traz dimensões de saúde, trabalho e educação, e essa construção coletiva mostra o grau de competência integral”, destacou Marivaldo Santos.

Finalizando a apresentação, Bezerra informou que cada casa de contêiner tem um custo de R$ 69 mil, gerando um impacto total de aproximadamente R$ 25 milhões, e destacou que a solução, apesar de não ser a mais barata, é a mais eficiente e possui maior durabilidade – podendo alcançar um período de até 20 anos de disponibilidade.

Para tirar o projeto do papel, foi necessária uma análise profunda do que é feito em outros países, de modo que os resultados iniciais são animadores. “Sou um entusiasta de tudo isso que estamos fazendo. Passamos cerca de seis meses analisando qual seria o modelo ideal, olhando para o que tem de mais avançado no mundo e agora estamos ousando”, finalizou Bezerra.  

Fotos: Marina Bustos