Na noite da última quarta-feira (9), a Associação Paulista de Medicina realizou a terceira edição de sua série de webinars de 2022, com transmissão ao vivo pelo YouTube. O tema escolhido para o encontro, realizado em parceria com a Regional de Guarulhos, foi “Uso de palivizumabe na prevenção das doenças respiratórias – um direito das crianças”.
Apresentado por João Sobreira de Moura Neto, 1º vice-presidente da APM Estadual, o evento foi moderado por Fabiana Santos Fonseca, presidente da Associação Paulista de Medicina – Guarulhos, que apresentou a palestrante convidada, Cristiane Pinto de Souza, especialista em Pneumologia Pediátrica pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
“O tema é bastante atual e, infelizmente, muitos de nossos colegas pediatras não têm conhecimento dele. Neste encontro, a palestrante irá abordar sobre a facilidade de acesso, o direito das crianças ao medicamento e sobre o que realmente a droga tem de benefícios”, ressaltou a moderadora.
Bronquiolite viral
Trata-se de um quadro obstrutivo das vias aéreas, que acomete a parte mais delicada do pulmão de recém-nascidos. Causado na maioria das vezes por vírus respiratórios, sendo o principal deles o Vírus Sincicial Respiratório, se caracteriza como um resfriado, com nariz congestionado, irritabilidade, falta de apetite, tosse intensa, coriza e dificuldade de respirar.
A palestrante iniciou sua exposição explicando que é algo muito comum na faixa etária pediátrica. “Podemos afirmar que 100% das crianças de até dois anos vão ter contato com o Vírus Sincicial Respiratório em algum momento, algumas delas vão evoluir para um quadro mais grave e outras não. Quando evoluem para o quadro de bronquiolite, do terceiro ao quinto dia, o vírus permanece no corpo da criança, atingindo as vias áreas inferiores e podendo resultar em tosse intensa e esforço respiratório.”
O Palivizumabe é um anticorpo monoclonal específico para vírus essencial respiratório, disponibilizado gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), indicado para aumentar a proteção de crianças contra infecção pelo Vírus Sincicial Respiratório (VSR) e em quadros graves de infecções respiratórias em lactentes, como a bronquiolite e pneumonias.
Deste modo, Cristiane ressaltou que o medicamento faz com que a criança fique protegida do Vírus Sincicial Respiratório, pois ainda não existe tratamento para a doença, somente é possível tratar os sintomas apresentados. “O tratamento para bronquiolite ainda é muito controverso, e não existe um específico, sendo tratados os sintomas que a criança apresenta. Por isso a importância de realizarmos a prevenção da doença com o medicamento”, explicou.
Transmissão e indicação de uso
Segundo pesquisas e dados, os casos ocorrem predominantemente em crianças abaixo de dois anos. O VSR pode ocorrer junto com outros vírus e bactérias e não confere imunidade, ou seja, a criança pode ser acometida mais de uma vez. A partir dos estudos, pode-se observar que aproximadamente 66 a 200 mil mortes por ano são causadas pela doença, durante o período sazonal, no outono e inverno.
A transmissão ocorre de pessoa para pessoa, com período de incubação de 3 a 5 dias, sendo o vírus eliminado por meio das secreções da nasofaringe. Quando os sintomas são iniciados, podem permanecer de 5 a 10 dias no organismo da criança.
A especialista ainda ressalta que o VSR é uma doença grave e que prematuros, crianças com doenças pulmonares crônicas e que apresentam cardiopatia congênita são os que estão mais propensos a serem acometidos. “Caso adquiram o vírus sincicial respiratório e evoluam para o quadro de bronquiolite, são essas crianças que médicos, enfermeiros e pais devem ter o máximo de cuidado.”
Estudos mostram que os prematuros menores de 32 semanas, que não têm doença pulmonar crônica da prematuridade, apresentam taxas de hospitalização de aproximadamente 13% no período de sazonalidade. Vale ressaltar que os anticorpos maternos para os prematuros são 20% menores, e a hospitalização dessas crianças é 20% maior do que as dos não prematuros.
“O palivizumabe é um anticorpo monoclonal, ou seja, não é uma vacina, é uma forma de prevenção da doença. A aplicação da droga deve ser feita mensalmente. Esse anticorpo monoclonal pronto irá evitar que o vírus penetre nas células humanas, impedindo sua replicação no organismo da criança”, comentou a especialista.
Direito ao medicamento
Tem direito à substância as crianças atendidas pelo SUS nascidas de forma prematura, que desenvolveram a doença pulmonar crônica ou cardiopatia congênita com repercussão hemodinâmica com menos de dois anos. Recebem o benefício através de um formulário preenchido pelo médico.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIM), todos os prematuros entre 29 e 32 semanas que são portadores de doenças cardíacas ou pulmonares nos dois primeiros anos de vida – independentemente da idade gestacional – também têm a indicação de utilizar o Palivizumabe, recebendo o medicamento via SUS, convênio ou serviços particulares.
O VSR está na lista da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados com a Saúde da OMS. Deste modo, existe a obrigatoriedade de custeio pelo bem da saúde, bem como pelo SUS, desde que o tratamento seja relatado como o mais adequado para o paciente.
“Alguns convênios não estão cumprindo a Lei 9656/98, nem aplicando o medicamento durante a internação na UTI e via ambulatorial em crianças que têm esse direito. Se nós não disponibilizarmos o Palivizumabe para nossos pacientes, estamos descumprindo uma lei e indo contra algumas regras do Ministério da Saúde”, complementa a palestrante.
Ao finalizar a apresentação, Cristiane Souza explicou que desde o ano passado, muitos hospitais que recebem crianças com bronquiolite realizam um caro exame chamado “painel viral”, usado para diagnosticar a doença, mesmo não havendo tratamento específico. “Acredito que seja provável que nos próximos anos ainda aconteçam internações por bronquiolite, porém com queda de casos de vírus VSR, pois irão diminuir as pesquisas para identificá-lo, mas os números não serão reais.”
Discussão
Respondendo sobre a necessidade de refazer a receita todos os meses, a palestrante explicou que o médico precisa calcular a dose, pois é receitado 15 mg por quilo, devendo ser aplicada durante os meses de sazonalidade da doença, com a pesagem realizada no mesmo dia da aplicação da medicação no caso do SUS e na consulta para emissão da receita, no caso de convênios e particulares.
Questionada por João Sobreira sobre a atenção e o conhecimento dos pediatras sobre o palivizumabe, a palestrante respondeu que as crianças estão recebendo e pediatras estão prescrevendo, porém a decisão não cabe só ao médico. “Hoje, no SUS, as crianças são acompanhadas por vários médicos de família, e devido à exaustão e sobrecarga gerada pela pandemia, tornou-se preciso relembrar os profissionais sobre a necessidade deste medicamento. Não é falta de conhecimento, é cansaço, e cabe a nós sempre deixarmos o assunto em evidência”, finalizou.
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