Webinar sobre tabagismo e cigarro eletrônico tem homenagem à Antônio Pedro Mirra

Com o tema “Tabagismo e cigarro eletrônico”, a Associação Paulista de Medicina realizou mais uma edição de seu webinar, na noite da última quinta-feira, 4 de maio. “Esta sessão é uma homenagem a um grande amigo, alguém que por muitos anos se destacou no combate ao tabagismo, nosso querido Antônio Pedro Mirra”, ressaltou o presidente da APM, José Luiz Gomes do Amaral.

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Com o tema “Tabagismo e cigarro eletrônico”, a Associação Paulista de Medicina realizou mais uma edição de seu webinar, na noite da última quinta-feira, 4 de maio. “Esta sessão é uma homenagem a um grande amigo, alguém que por muitos anos se destacou no combate ao tabagismo, nosso querido Antônio Pedro Mirra”, ressaltou o presidente da APM, José Luiz Gomes do Amaral.

Com transmissão ao vivo pelo canal da entidade no YouTube, a reunião teve palestra dos especialistas Aldo Agra e Stella Regina Martins. A moderação ficou com os diretores Paulo Manuel Pêgo Fernandes (Científico) e Álvaro Atallah (Economia Médica e Saúde Baseada em Evidências).

“É um tema de suma importância, tanto a questão do tabagismo, que já é uma luta de várias décadas para a classe médica e sociedade como um todo, como também uma atualização em relação ao cigarro eletrônico, que acabou ganhando nova divulgação de informações desencontradas sobre os potenciais malefícios do vício”, salientou Fernandes.

“As evidências mais recentes sobre o cigarro eletrônico são que realmente causam lesões pulmonares nos adolescentes e jovens, e é preciso que o Brasil se prepare para isso”, complementou Atallah.

Cigarro eletrônico

Também conhecido como vape, juul, smok, e-cigarete, ecigar ou apenas tabaco aquecido, o cigarro eletrônico é um dispositivo para fumar contendo uma bateria de lítio. Pelo aquecimento, produz um aerossol que pode ou não conter nicotina. Na maioria das vezes, pode conter também aditivos que agregam sabor, disfarçando outras substâncias presentes.

Aldo Agra, especialista em Pneumologia pela Unifesp, explica que o cigarro eletrônico já se encontra em sua quarta geração. Na primeira versão, seu formato era semelhante ao cigarro convencional, com sistema fechado e diferencial do led na ponta que acendia a cada tragada. Passando para a segunda geração, o sistema se tornou aberto e ganhou formato de caneta.

“Em sua terceira geração, o dispositivo perdia sua semelhança com o cigarro convencional, continha sistema aberto, com maiores reservatórios, e a possibilidade de ser recarregado e conter nicotina, canabidiol e THC, produzindo muito vapor. Na versão atual, o dispositivo lembra muito um pen-drive, e com grande diferencial para os demais, o sal de nicotina, que contém um altíssimo potencial de instalação ultrarrápida de dependência”, diz o palestrante.

De acordo com ele, a rápida dependência à nicotina é comum, pois a substância foi associada ao ácido benzoico, o que deixou o gosto camuflado, com aerossol facilmente inalado, maior absorção pulmonar e concentração de nicotina extremamente alta. “Desta maneira, a instalação da dependência é muito mais rápida, bem como a satisfação com o uso do dispositivo”, completa.

Segundo dados apresentados pelo palestrante, como a Vigitel Brasil 2019 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), 6,7% da população em algum momento da vida já utilizou o cigarro eletrônico, sendo que 2,32% faziam o uso diário ou ocasional. Ainda, a população usuária do dispositivo é predominantemente jovem, com faixa etária entre 18 e 24 anos.

“Não se comprova a teoria de que o cigarro eletrônico foi criado para tratar o tabagismo de uma forma menos lesiva. Na verdade, essa ideia é uma camuflagem para quem nunca teve contato com a nicotina por meio dos cigarros convencionais e agora quer se expor a esta forma de tabaco”, salienta Agra.

Também ressalta que, além da nicotina, várias outras perigosas substâncias estão presentes dentro dos dispositivos, entre eles glicerol, acroleína (danos pulmonares e cardiovasculares), etilenoglicol, metais pesados e propilenoglicol (um irritante pulmonar que, quando misturado no cigarro eletrônico, se transforma em formaldeído, substância cancerígena lesiva).

“O aparelho também foi alvo de uma nova doença em meados de 2019, a epidemia da chamada Evali (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury, ou doença pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico ou vaping), que deixou diversos usuários jovens na UTI. Na maioria das vezes, estava associada ao uso da cannabis, acometendo pessoas jovens, com menos de 24 anos, que adquiriram o dispositivo no mercado informal e de marca desconhecida”, informa o pneumologista.

Aldo Agra ainda destaca que os usuários dizem que podem fumar em qualquer lugar, sem colocar em risco outras pessoas. “O que sabemos até o momento, entretanto, é que as concentrações de partículas finas encontradas nas correntes primárias e secundárias são semelhantes ao cigarro convencional, o que eleva a exposição passiva a um risco potencial.”

Há quem diga que o uso não é proibido, porém, a Resolução 46/2009 do Ministério da Saúde proíbe a comercialização, importação e a propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar, especialmente os que alegam substituição de cigarro, cigarrilha, charuto, cachimbo e similares no hábito de fumar, ou que objetivem ser alternativa no tratamento do tabagismo.

Finalizando, o especialista esclareceu sobre as formas de tratamento para possíveis doenças desencadeadas pelo uso do cigarro eletrônico. “O primeiro passo é a tentativa do tratamento

comportamental e farmacológico, assim como fazemos com usuários do cigarro convencional, porém, com menores respostas.”

Riscos da nicotina

“Antes de 1960, a nicotina era completamente diferente da substância que conhecemos hoje. A nicotina atual passa a conter base livre ou free base nicotine, entregando mais nicotina na fumaça do cigarro por ser mais facilmente absorvida pelos pulmões, cérebro e tecidos, sendo não atrativa e de sabor amargo, sendo que aditivos são usados como possível solução”, explica Stella Regina Martins, médica assistente do Grupo de Gestão de Cessação do Tabagismo da Divisão de Pneumologia do InCor/HC-FMUSP.

De acordo com ela, os aditivos são substâncias adicionadas de maneira intencional em produtos derivados do tabaco, com o intuito de camuflar o gosto ruim da nicotina, disfarçar o cheiro desagradável, reduzir a fumaça e diminuir a irritabilidade da fumaça em pessoas não fumantes. Entre os principais aditivos citados estão o ácido benzoico, amônia, etanolamina, ácido cítrico e lático, que podem causar dispneia, irritação na pele e olhos, lesão ocular grave e edema pulmonar.

“Percebemos que, de certa forma, a indústria busca instalar a dependência de uma forma mais fácil e tornar mais palatável a nicotina de base livre, colocando aditivos que atingem ainda mais o organismo”, destaca a especialista. Sobre os riscos da nicotina no sistema vascular, Stella ressalta que a substância ativa o sistema nervoso simpático, causando vasoconstrição coronariana, aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial e contratilidade miocárdica, com, possivelmente, uma morte súbita.

“A nicotina também pode atingir o metabolismo dos lipídeos, à medida em que eleva os triglicerídeos e reduz o HDLc. Outro problema é a tromboangeíte obliterante, ou Doença de Buerger, que ocorre quando há espessamento das paredes das artérias, vasoconstrição e redução da luz arterial, levando à obstrução do fluxo sanguíneo”, salienta.

Em relação ao sistema reprodutor masculino, a substância leva à infertilidade por diminuir os níveis de testosterona, causando também disfunção erétil e impotência sexual. Além disso, espermatozoides de fumantes têm menor contagem, maior índice de anormalidade e baixa capacidade de fertilização. Sobre a mulher fumante, o vício pode levar à menopausa precoce, alteração na periodicidade do ciclo menstrual, osteoporose e infertilidade.

“Os efeitos da nicotina em mulheres gestantes estão relacionados à alteração do oviduto e distúrbios como fertilização, nidação do ovo e gravidez ectópica. Ainda, a nicotina pode passar pelo cordão umbilical e, consequentemente, alcançar o líquido amniótico e o sangue fetal, podendo causar anomalias no crescimento fetal”, ressalta.

A especialista ainda apresentou os efeitos da nicotina no cérebro do adulto. Uma vez que a pessoa fuma, a nicotina gera impacto cerebral em apenas 7 segundos, ativando os receptores nicotínicos de acetilcolina e liberando dopamina, com sensação imediata de prazer e bem-estar. “Tudo o que dá prazer, obviamente, gera um evento positivo, uma memória de sensação agradável e desejo de repetição, e nisso se instala a dependência.”

Já no cérebro adolescente, a substância altera o funcionamento e a maturação do lobo pré-frontal, área responsável pela parte de atenção, cognição, julgamento, tomada de decisão, planejamento e formação de personalidade. “Apesar de ainda não termos o nexo de causalidade entre nicotina e câncer, faz-se necessária a condução de mais estudos sobre os efeitos das substâncias e a possível relação com a doença”, completa.