Mal silencioso: subestimado, infarto na mulher tem mais risco de agravamento

Subestimado, infarto na mulher tem mais risco de agravamento.

O que diz a mídia

Subestimado, infarto na mulher tem mais risco de agravamento.

Há exatos 22 anos, quando o dia 29 de setembro foi definido pelas sociedades médicas como o Dia Mundial do Coração, a ideia era conscientizar a população masculina sobre os cuidados com a saúde do órgão vital. Sim, pois o coração das mulheres, então, não preocupava os especialistas.

De lá para cá, no entanto, elas foram pouco a pouco crescendo nas dramáticas estatísticas das doenças coronárias, revolucionando os conhecimentos nacardiologia. Em linhas gerais, descobriu-se que infarto está longe de ser uma doença masculina. Ele se manifesta de forma diferente no corpo feminino, dos sintomas àgra- vidade e aos impactos dos fatores de risco. Mesmo assim, os profissionais de saúde afirmam que o problema ainda é desdenhado por muitos, inclusive as próprias mulheres.

A pedido do GLOBO, dois dos melhores cardiologistas do país, Ludhmila Hajjar, professora da Cardiologia da USP, diretora da Cardiologia do Hospital Vila Nova Star, e Roberto Kalil, presidente do Conselho Diretor do InCor e diretor da Cardiologia do Hospital Sírio-Libanês, detalham as diferentes características da doença entre os dois sexos, inflamação e dissecção (uma espécie de rasgo) das artérias coronárias.

É como se o coração feminino fosse alvo de ataques. Há um componente genético: a mulher tem cromossomos específicos que facilitam esse ataque.” O Na mulher é mais grave Ludhmila Hajjar: “No homem o infarto ocorre sobretudo pelo rompimento de uma placa de gordura que leva a uma obstrução abrupta do fluxo sanguíneo no vaso coronariano. Mas na mulher, além disso, outras doenças podem afetar o fluxo sanguíneo do coração.

Por exemplo, doenças dos pequenos vasos, Elas têm infartado mais Roberto Kalil: “Hoje em dia a incidência é praticamente a mesma em homens e mulheres. Há cinquenta anos, a cada dez mortes por infarto, nove eram homens e uma mulher.

Agora,a proporção é de seis homens e quatro mulheres. Um dos maiores responsáveis pela mudança é o estilo de vida. Não me refiro somente ao fato de as mulheres terem passado a viver o impacto do estresse do mercado de trabalho, mas pela adoção de hábitos péssimos para o coração. Cigarro, pressão alta, diabetes, insônia, se- dentarismo e obesidade estão entre eles. A mulher tem um risco três vezes mais alto de morrer do coração do que de câncer de mama.” Elas infartam mais tarde Hajjar: “Entre os homens, o infarto é mais comum entre os 50 e 60 anos.

Na mulher, ocorre geralmente entre os 60 e 70 anos. Antes disso elas têm a proteção dos hormônios femininos. O estrogênio, por exemplo, tem função va- sodilatadora, evita o acúmulo do LDL, o colesterol ruim, e facilita a ação do HDL, o colesterol bom.

Mas na menopausa o corpo sofre transformações que aumentam o risco de infarto que vão além da ueda hormonal —acúmulo e gordura abdominal, au- mentoda resistência à insulina e maior predisposição à coagulação do sangue.” 3 Elas pedem ajuda depois Kalil: “As mulheres demoram para buscar ajuda médica porque simplesmente subestimam a dor. É mais fácil ela pensar que possa ser ansiedade, cansaço, TPM.

Um estudo recente do Colégio Americano de Cardiologia mostrou que demoram 12 horas, em média, para procurar um serviço de saúde ou um profissional, a partir dos primeiros sinais de dor, mais que o dobro em relação aos homens. Quanto mais tarde o atendimento, maior o risco do problema se agravar.”

Os sintomas são diferentes Hajjar: “O quadro clínico clássico é o mais prevalente para os dois. É a dor no peito, como se fosse uma pata de cavalo pressionando. Essa sensação irradia para o braço esquerdo e dá náuseas e sudorese fria. Mas as mulheres também têm maior risco de ter sinais e sintomas atípicoseines- pecíficos. Muitas sentem só tontura, palpitação, dor no abdome, ou dor direcionada para o queixo.”

Medicina feita por homens Hajjar: “Hoje há um equilíbrio entre ; os médicos que estão se formando. Cerca de 46% são mulheres e 54% são homens. E o número de médicas vem crescendo. Mas na cardiologia brasileira há uma diferença brutal: 70% dos profissionais são homens. E essencial termos mais especialistas do sexo feminino. Isso ajudaria a dar mais importância à saúde feminina e a ensinar a mulher a cuidar mais da saúde do coração.

Outro dado discrepante é em relação ao número de mulheres que partici- am de estudos clínicos re- acionados ao coração. A Sociedade Européia de Cardiologia mostrou que apenas 25% dos voluntários são do sexo feminino. Ou seja, os tratamentos são testados fundamentalmente no corpo do homem. Esse cenário precisa mudar.”

Fonte: O Globo