Com Ivete Berkenbrok e Gilberto Natalini, webinar debate se velhice é doença

Na última quarta-feira, 29 de julho, a Associação Paulista de Medicina (APM) e a Associação Médica Brasileira (AMB) se reuniram para mais uma edição do Webinar APM/AMB, dessa vez com o tema “Velhice é doença?”. Os convidados da noite foram Ivete Berkenbrok, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), e Gilberto Natalini, médico e ex-vereador da cidade de São Paulo.

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Na última quarta-feira, 29 de julho, a Associação Paulista de Medicina (APM) e a Associação Médica Brasileira (AMB) se reuniram para mais uma edição do Webinar APM/AMB, dessa vez com o tema “Velhice é doença?”. Os convidados da noite foram Ivete Berkenbrok, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), e Gilberto Natalini, médico e ex-vereador da cidade de São Paulo.

A discussão foi motivada pela última atualização da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionadas à Saúde (CID), da Organização Mundial da Saúde (OMS). Isso porque os especialistas definiram que a velhice será tratada como doença, sob o código MG2A, a partir de 1º de janeiro de 2022. Uma decisão que tem sido considerada simplista e ofensiva por muitos.

O anfitrião José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, definiu o evento como uma oportunidade de discussão de um assunto palpitante, oportuno e de grande relevância. “Para isso, é um prazer contar com a presença de Natalini, um médico e um cidadão exemplar, um dos maiores nomes da política brasileira de nossa geração”, comentou.

Na sequência, César Eduardo Fernandes, presidente da AMB, reverenciou Ivete. “Recém-empossada na SBGG, já deu mostras nesse pouco convívio que tivemos na Associação Médica Brasileira do dinamismo que irá emprestar à entidade.”

Inclusão na CID
Segundo Ivete Berkenbrok, a partir da inclusão da velhice na CID, vários segmentos da sociedade se mobilizaram para entender o porquê de os 200 especialistas que tomaram essa decisão optaram por inserir essa palavra dentro do código.

A seguir, lembrou que a CID existe desde 1893 e foi criado por uma associação internacional de estatística. Ao longo das décadas, foi revisada diversas vezes e hoje está na 10ª edição. A OMS é a atual responsável pelo documento, tendo assumido a responsabilidade a partir da 6ª edição.

“Nós entendemos e estamos participando de todo o progresso da Medicina e da Biotecnologia. A CID precisa ser revisada e adequada para novos procedimentos, descobertas, infecções etc. A atualização é super necessária. Não discutimos isso”, alertou a presidente da SBGG.

Parte dessa importância da Classificação é o fato que ela permite uma linguagem universal entre colegas de todo o mundo, sejam médicos, pesquisadores, cientistas, epidemiologistas

etc. Por meio dos códigos, é possível saber determinada população que sofre mais com qual doença e políticas públicas podem ser construídas a partir disso.

“Desde essa notícia, já participamos de várias discussões, inclusive uma audiência pública na Câmara dos Deputados com a presença de representante da OMS. Eles nos disseram que se trata de um equívoco e que a Organização não quer definir velhice como doença, mas sim como uma condição – como hoje já há a gravidez na CID. O intuito seria não utilizar mais o código já existente da senilidade, por se tratar de um termo pejorativo. Sinceramente, trocar um pelo outro não me parece boa escolha”, analisou Ivete.

A preocupação existe também pelo preconceito e pelas agressões que os idosos já sofrem. Sobretudo por, nos últimos 18 meses, eles estarem no centro das discussões sobre a Covid-19, já que são a população mais afetada.

“O idoso está na imprensa sempre atrelado a questões ruins. Agora, se aceitarmos essa CID, colocaremos 32 milhões de brasileiros como doentes – o número estimado da população acima de 60 anos no País. Também nos preocupa que profissionais mal preparados decorem o código da velhice e aí, sem investigar, rotulem as pessoas como doentes com ele.”

Isso significaria, conforme explicação da especialista, um cenário, daqui a uma década, de perda em questões epidemiológicas relacionadas às doenças que realmente cursam com o envelhecimento. “É inegável que o envelhecimento cursa com doenças, mas daí a considerar a idade cronológica como doença, não podemos aceitar. Mesmo que a intenção da OMS ou dos especialistas não tenha sido essa”, completou.

Preocupação social
Gilberto Natalini começou a sua intervenção enaltecendo o trabalho realizado por José Luiz Gomes do Amaral nas últimas décadas, a quem considera um líder não só dos médicos, mas da Saúde, em São Paulo e no Brasil.

“Temos muita satisfação de vê-lo atuando. E de ver toda a direção da APM: são pessoas de bem que lideram a nossa Associação. Também agradeço e parabenizo César Fernandes, presidente da AMB, que tem sido brilhante na condução da Associação com posições firmes e decentes. Me sinto absolutamente representado”, afirmou Natalini, que é fundador e presidente da Associação Popular de Saúde.

O médico lembrou que, em sua trajetória de 20 anos como vereador em São Paulo e de 60 anos de militância por causas sociais e de Saúde, além do exercício constante da Medicina, se dedicou sempre ao tema do envelhecimento.

Na sua avaliação, hoje vivemos um paradoxo. Após tanta luta da Ciência, da Medicina, da política social e dos trabalhadores – em todo o mundo – para aumentar o tempo de vida dos seres humanos, agora vemos os idosos serem classificados como doentes.

“Tomamos um susto com essa decisão. Nos chocou. Se a humanidade vive mais e envelhece mais, daqui a pouco metade da humanidade estará classificada como doente, por essa decisão. Podemos, claro, ter velhos com determinadas doenças, assim como adultos jovens e crianças”, comentou o ex-vereador.

Debate
Após a intervenção inicial dos convidados, houve tempo dedicado à discussão conjunta do tema. César Fernandes, por exemplo, afirmou ter ficado claro – após a fala dos especialistas – que catalogar velhice como doença pode trazer prejuízos na avaliação epidemiológica e na formulação de políticas de saúde pública. “Isso será danoso. Não vejo como pode ser benéfico. Nós, do movimento associativo, devemos nos debruçar sobre isso, emprestando solidariedade àqueles que lutam para que isso não se confirme.”

José Luiz Gomes do Amaral também apontou suas reflexões. “Velhice é doença? Ficou bem claro aqui que não. É uma condição que não se associa necessariamente a uma causalidade. Se associa a limitações, mas também a algumas oportunidades. Entendo, então, que a idade não necessariamente representa apenas limitações. Entendo também que a idade nem sempre significa condição de diminuição da reserva funcional. Desse modo, penso que saímos da premissa que velhice é doença. Não é verdade e não deveríamos tratar dessa forma”, completou o presidente da APM.

Ivete Berkenbrok adicionou que, além de tudo, não há nenhuma necessidade de incluir a velhice como condição na CID. “Temos tantas coisas para resolver e pensar [antes]. Como em melhorar a longevidade das pessoas, diminuir a fragilidade e estimular para que idosos sejam protagonistas do seu próprio envelhecimento.”

Por fim, Gilberto Natalini comentou que as pessoas têm ficado assustadas quando escutam essa notícia pela primeira vez – não somente médicos e profissionais de Saúde, mas todos os cidadãos. De modo geral, o médico apontou observar que grande parte da sociedade tem tido opinião similar às apresentadas no encontro.

“Por questões médico-científicas – para não perdermos em questões epidemiológicas e fazermos diagnósticos de doenças e não de idade. E por questões sociais. Os idosos sofrem muito preconceito, violência e exploração. Haverá um impacto social ao jogar essa massa de pessoas para a classificação de doentes”, finalizou o ex-vereador.

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