Último Cine Debate do ano traz discussão sobre o longa ‘Loucura de amor’

Na última sexta-feira (3), foi realizada a oitava e última edição do ano do Cine Debate da Associação Paulista de Medicina, coordenado por Wimer Bottura Júnior, psiquiatra e psicoterapeuta. O evento teve discussão sobre o filme ‘Loucura de amor’, com enfoque na questão “toda maneira de amar realmente vale a pena?”.

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Na última sexta-feira (3), foi realizada a oitava e última edição do ano do Cine Debate da Associação Paulista de Medicina, coordenado por Wimer Bottura Júnior, psiquiatra e psicoterapeuta. O evento teve discussão sobre o filme ‘Loucura de amor’, com enfoque na questão “toda maneira de amar realmente vale a pena?”.

“O objetivo principal do Cine Debate é que as pessoas possam discutir situações, podendo assim passar suas impressões sobre o assunto, pois são diferentes, nem melhores, nem piores, mas complementares, essa é a grande ideia deste trabalho”, iniciou Bottura.

Dirigida por Dani de la Orden, a comédia romântica espanhola acompanha as loucuras de Adri (Álvaro Cervantes) e Carla (Susana Abaitua). Após passarem uma noite inesquecível juntos, Adri descobre que Carla estava curtindo a fuga de um hospital psiquiátrico. Na noite em questão, seu coração é completamente conquistado e, com o tempo, ele descobre que a única maneira de voltar a encontrá-la é se internando no centro onde ela vive.

Tipos de amor

Hermano Tavares – professor associado do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, fundador e coordenador do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso do Instituto de Psiquiatria do HC/FMUSP – foi o primeiro palestrante a apresentar sua opinião sobre a obra.

“Minha nota para este filme é 8, me diverti, e apesar de ser uma comédia romântica leve, sou grato por ter visto a abordagem de temas importantes como o retrato dos serviços e centros de saúde mental. Outra questão que gostei bastante, e que é preciso destacar, foi quando o personagem Adri faz aquela típica declaração de amor para Carla ‘Eu acredito em você, se você quiser, vai conseguir superar tudo isso, vai dar tudo certo’. Ela, estando apaixonada, se encanta pelo discurso motivacional e acredita que o amor irá salvá-la de sua doença mental”, disse o palestrante.

“Após a declaração, Carla para de tomar seus remédios. Com diagnóstico de bipolaridade, começa a entrar em mania, e este quadro reforça a fantasia de força, capacidade e poder, e isso a expõe ao perigo, o que é uma realidade. O interessante é que todos que não são da área psiquiátrica vêm com o mesmo discurso: ‘A pessoa precisa de amor, carinho e senso de racionalidade’, mas o longa explica com uma certa gentileza que as coisas não são bem assim”, complementou.

Conforme observou Tavares, se pararmos para olhar atentamente sobre o que traz as pessoas a um consultório de saúde mental, de 25% a 50% procuram a especialidade por conta de relacionamentos amorosos frustrados, o que os causou uma crise de vida e jogou o indivíduo nessa situação. “Não sei se é mito ou fato, mas nós somos levados talvez por uma questão cultural a acreditarmos que nossa felicidade depende fundamentalmente de três coisas: sucesso reprodutivo, felicidade nos relacionamentos amorosos e de sermos eficientes e realizados profissionalmente.”

O especialista ainda ressalta que para muitas pessoas o sentimento do amor é visto como algo ruim, mas para ele pode ser considerado um mosaico, composto por vários componentes que juntos geram a sensação de ser amado ou de estar amando. Também falou sobre os seis tipos de amor descritos pelo escritor canadense John Alan Lee, que são: amor romântico, erótico, lúcido, pragmático, obsessivo e ágape.

“Quando estamos realmente envolvidos em uma relação amorosa, não importa se seja hétero, homo ou não-binária, desenvolvemos experiências nos seis canais. Dependendo da personalidade de cada pessoa, existe um canal que é mais desenvolvido. Na relação do casal protagonista, podemos ver cada um desses canais e as fases de cada uma deles”, destacou.

Todo amor vale a pena?

A segunda palestrante da noite foi Nielse Maluf, diretora da Gemma Consult, consultoria em gestão de pessoas e certificada como International Coach pelo ILM (Institute of Leadership & Management de Londres). Em sua exposição, disse que sentiu um certo incômodo ao assistir o filme.

“A genialidade do diretor do filme é apresentar questões pesadas de uma forma leve, mas fiquei incomodada, pois o filme não fala de amor. O título original do longa é ‘Louco por ela’, o que nos traz esse duplo sentido, louco patológico e louco exagerado. O personagem Adri se fazia poderoso, estava sempre acima das fragilidades do amor e da paixão, e precisava de algo forte para chacoalhar seu dia a dia e sua rotina corriqueira. Todo exagero e intensidade de Carla o levaram para um estado extraordinário, mas ela não queria nada sério e deixou isso bem claro. Ele já estava no estado “patológico” da loucura, e começa a ficar deprimido, desenvolvendo pensamentos obsessivos, típicos da paixão”, enfatizou a especialista.

“Naquele momento, Adri estava em um relacionamento de mão única, tinha se lançado no voo sem nenhuma garantia. Em alguns momentos, Carla demonstra muito mais sanidade do que ele. Adri não estava apaixonado por ela, mas sim por alguém com quem ficou por uma noite e idealizou”, completou.

A especialista ainda diz que nos apaixonamos por aquilo que gostaríamos que o outro fosse, porque na fase da paixão não temos a capacidade de enxergar o outro. Temos a ideia de buscar o que nos falta e que traz o lado mais extraordinário. “Quando Carla começa a perceber o envolvimento de Adri com os amigos dela de uma forma positiva, o filme começa a nos mostrar outros tipos de amores, entrelaçamentos afetivos vividos por ela dentro da clínica.”

Concluindo, Nielse explica que após todas as fases da paixão, surge a dúvida de existir ou não a possibilidade do amor, porque na vida como ela é, nem sempre aquilo que é extraordinário pode ser vivido na ordinariedade do dia a dia. “No final do filme, eles trocam telefones e surge a promessa de se ligarem após a saída dela da clínica. A paixão vira promessa de amor, se isso vai se desencadear e vai virar uma relação amorosa, é um porvir. A palavra que fica no final do filme é esperança, nos apaixonamos na expectativa de nos tornarmos alguém melhor.”

Debate

Ao final das apresentações, Bottura também fez suas observações sobre o filme. “Ao escolher esse filme, fiquei preocupado com as orientações de pessoas que têm depressão. A maioria dos que não conhecem a doença fala ‘Está triste? Saia, vá fazer alguma coisa de útil, sorria!’. Escolhi o filme por apenas uma frase ‘Se encontrar alguém triste, procure compreender’. Neste aspecto, falo do amor, pois o amor é isso, é compreender.”

De acordo com ele, amar é perceber o outro. “Na verdade, Adri não estava apaixonado pela pessoa que Carla era, mas sim pelo fato de conquistá-la por uma noite, só não contava que ela era totalmente o oposto das mulheres com quem ele se relacionava. Ela trouxe uma quebra de paradigma nas relações dele”, acrescentou.

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