Ansiedade e depressão crescem mais de 30%

Os países das Américas registraram um aumento de mais de 30% nos diagnósticos de transtornos de ansiedade (32%) e depressão (35%) durante a pandemia de covid-19

O que diz a mídia

É o que aponta o relatório Uma Nova Agenda para a Saúde Mental na Região das Américas, divulgado no dia 9 pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). O documento informa também que 8 em cada 10 pessoas com problemas graves de saúde mental, ou seja, 80%, não tiveram acesso adequado a tratamentos necessários durante o ano de 2020.
Os dados fizeram a entidade pedir para que os líderes de cada país das Américas coloquem a saúde mental no topo de prioridades de suas respectivas agendas de governo. Foram dez recomendações sugeridas.
Algumas delas incluem integrar a saúde mental em outras políticas do Estado, investir em pesquisa e em coleta de dados sobre o assunto, resguardar os direitos humanos daqueles que sofrem com esse tipo de problema e tratar o racismo e a discriminação racial como fatores que estão ligados à saúde mental.
INCAPACIDADE. A investigação da Organização Pan-Americana da Saúde também revelou que quadros de depressão e ansiedade são a terceira e quarta principais causas de incapacidade na população dos países das Américas, e que o álcool é responsável por 5,5% de todas as mortes de pessoas que vivem na região. Além disso, de acordo com o relatório da entidade, a taxa regional de suicídio ajustada por idade aumentou 17% entre 2000 e 2019, e a prática “tira a vida de 100 mil pessoas por ano”.
AGRAVAMENTO. Segundo o informe da Opas, os problemas de saúde mental se agravaram na pandemia de covid-19 em razão do crescimento do desemprego, da insegurança financeira, do luto pela perda de pessoas próximas, da preocupação constante, além da tristeza de conviver em uma das maiores crises sanitárias da história recente.
Dentro desse cenário, a organização trouxe outros números preocupantes: além do alto porcentual de pessoas com condições graves, como psicose e esquizofrenia, que não conseguiram receber os cuidados necessários para o tratamento de suas condições clínicas, 65% dos países interromperam os serviços essenciais de saúde mental durante o ano de 2020.
A falta de acesso aos cuidados está relacionada aos baixos investimentos dos países em saúde mental, que não chegam a ultrapassar 3% do total do montante investido em saúde, de acordo com o médico brasileiro Jarbas Barbosa, diretor da Opas.
Ele disse também que hospitalizações de longa duração, escassez de profissionais treinados e a dificuldade de acesso aos serviços por parte daqueles que vivem em regiões mais vulneráveis também são motivos que explicam a lacuna entre os pacientes e os tratamentos aos quais eles precisam ser submetidos.
“Investir em saúde mental é crucial para promover o desenvolvimento humano equitativo e sustentável para que todos vivam com bem-estar e dignidade”, disse Epsy Campbell Barr, ex-vice-presidente da Costa Rica e presidente da Comissão de Alto Nível sobre Saúde Mental e Covid-19, criada pela Opas em 2022. “Devemos lembrar que o fardo da saúde mental não é uma luta privada, mas uma crise de saúde pública que merece ação urgente e imediata”, continuou.
A comissão presidida por Epsy Campbell é composta por 17 especialistas, que incluem membros de governo, da sociedade civil, do mundo acadêmico e pessoas com experiência em problemas de saúde mental. O grupo tem a tarefa de fornecer orientação à Opas e aos Estados Membros da entidade sobre como promover a saúde mental na região em tempos de pós-pandemia.
FAROL. O relatório tem sido tratado pelos especialistas envolvidos como uma peça importante para mudar a forma como as nações lidam com o tema. Nestor Mendez, copresidente da Comissão de Alto Nível sobre Saúde Mental e Covid-19 e diretor-geral adjunto da Organização dos Estados Americanos (OEA), definiu o material como “um farol de esperança”.
“Hoje, não lançamos apenas um relatório; lançamos um farol de esperança, um roteiro para a mudança na forma como vemos, tratamos e priorizamos a saúde mental nas Américas”, disse Mendez.
“Agora está em nossas mãos mudar a forma como abordamos a saúde mental, especialmente em uma crise global que a afetou profundamente”, acrescentou.
RACISMO. Entre as dez recomendações que a Opas elencou como forma de os países melhorarem a saúde mental e o bem-estar das suas populações está também o combate ao racismo.
Para isso, a organização propõe que os governos adotem quatro frentes de atuação: trabalhar diretamente com as pessoas que sofrem esse tipo de violência, sobretudo negros e indígenas; desenvolver um plano nacional contra a discriminação racial; fortalecer as leis e a política para combater o racismo e promover a equidade; e fazer intervenções para criar ambientes antirracistas.
No relatório, a Opas cita como exemplo a Lei de Cotas, sancionada no Brasil em 2012, que ampliou o acesso de negros, pardos e indígenas às universidades do País. Porém, “apesar do sucesso”, diz a entidade, a legislação ainda esbarra em desafios.
“Entre eles, a persistência do preconceito e da discriminação contra os alunos cotistas, tanto por parte de outros alunos quanto de professores; falta de recursos e serviços de assistência estudantil para esses alunos; e a contínua concentração de estudantes de baixa renda em carreiras que geram menor remuneração.” A organização ainda diz no relatório que os “afrobrasileiros constituem mais da metade da população” no Brasil, mas continuam convivendo com o racismo estrutural, institucional e interpessoal no País, experimentando uma taxa mais alta de desemprego e recebendo salários médios inferiores em relação aos brancos que trabalham em posições semelhantes.
OMS. O documento traz ainda reflexos de uma análise publicada há um ano pela Organização Mundial da Saúde (OMS), considerada a maior revisão sobre saúde mental no mundo já publicada.
Nela, se registrava o avanço de 25% nos casos de depressão e ansiedade apenas no primeiro ano da pandemia.
Conforme o órgão, em 2019, quase 1 bilhão de pessoas – 14% dos adolescentes do mundo – viviam com um transtorno mental.
O suicídio foi responsável por mais de uma em cada 100 mortes e 58% dos suicídios ocorreram antes dos 50 anos de idade.
Os transtornos mentais, diz o texto, são a principal causa de incapacidade. De cada seis anos vividos por pessoas com incapacidade nas Américas, um se deve a transtornos mentais. Pessoas com condições graves de saúde mental morrem em média 10 a 20 anos mais cedo do que a população em geral, principalmente por doenças físicas evitáveis.
O abuso sexual infantil e o abuso por intimidação são importantes causas da depressão. Desigualdades sociais e econômicas, emergências de saúde pública, guerra e crise climática também surgiram entre as ameaças estruturais globais à saúde mental.
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse quando da apresentação do relatório que “todos conhecemos alguém afetado por transtornos mentais”. “O investimento em saúde mental é um investimento em vida e futuro melhores para todos”, afirmou.

Fonte: O Estado de S. Paulo