Pesquisadores desenvolvem vacina contra leishmaniose

Uma nova vacina contra a leishmaniose visceral canina está sendo desenvolvida por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

O que diz a mídia

Uma nova vacina contra a leishmaniose visceral canina está sendo desenvolvida por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Batizado de NasoLeish, o novo imunizante é de fácil aplicação e destinado a filhotes de cachorros, além de apresentar uma eficácia mais alta do que a LeishTec —injetável que era usado para proteger os animais, mas que teve sua fabricação e venda proibidas no final de maio pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) por conta de irregularidades em sua formulação.
Segundo a professora Barrira Bergmann, uma das desenvolvedoras da vacina, o novo produto apresenta várias vantagens em comparação com o imunizante retirado do mercado. Uma das principais é a via de aplicação, que é nasal. Uma pequena gota da NasoLeish é pingada em cada narina dos filhotes. A segunda dose é administrada três semanas após a primeira.
No caso da Leish-Tec, os cães precisavam completar 4 meses para receber a proteção, e a vacina era aplicada em três doses. A especialista pondera que esse tempo de espera colocava os animais em risco de infecção, já que o leite das cadelas não contém anticorpos contra o protozoário Leishmania, causador da leishmaniose visceral.
Nos estudos de fase 1 e 2 do novo imunizante, os pesquisadores observaram que, em animais infectados pelo Leishmania, a NasoLeish reduziu em 90% a quantidade de parasitas presentes no fígado dos cães vacinados com o novo produto, em comparação com animais não vacinados. Aqueles imunizados com a LeishTec apresentaram uma redução de 75% de protozoários, quando comparados com pets não protegidos.
—A NasoLeish é composta de um conjunto de antígenos, que são as proteínas do parasito, e não apenas um, como é comum em outras vacinas (tanto a que estava disponível no Brasil como outras duas que são comercializadas na Europa). E isso que dá uma proteção mais robusta — explica Bergmann. —Além disso, usamos um adjuvante diferente dos demais imunizantes do mercado. O nosso adjuvante inovador tem propriedades muco-penetrantes, ou seja, que penetram mais facilmente na mucosa nasal para estimular a resposta imunológica sem provocar irritação local.
Segundo a pesquisadora, isso traz um grande potencial para uso da vacina na proteção da leishmaniose visceral em humanos. A tecnologia pode ajudar também no desenvolvimento de imunizantes contra alergias e doenças autoimunes.
NOVOS PASSOS A próxima etapa é realizar um estudo de fase 3 para identificar quantos animais desenvolvem ou não a leishmaniose após serem imunizados com a NasoLeish. Com o auxílio da Inova UFRJ (órgão responsável pela política de inovação da universidade), o imunizante foi patenteado e a tecnologia foi transferida para a startup das professoras responsáveis pelo desenvolvimento da vacina, dentre elas Bergmann. Esse é um processo necessário para que a fórmula seja negociada com alguma empresa que custeie a última fase de estudos clínicos, o que possibilitará a chegada do imunizante ao mercado.
Na expectativa de Bergmann, a vacina estará disponível para uso dois anos após o término da fase 3 de testes clínicos. Já há farmacêuticas interessadas em dar prosseguimento no imunizante brasileiro.
A NasoLeish é fruto de 20 anos de estudo da professora e sua equipe. O grupo também desenvolveu um novo tratamento de dose única contra a leishmaniose visceral canina, que também está em fase de testes.
—Qualquer vacina que visa dar proteção contra uma doença causada por protozoário, não só leishmaniose como doença de Chagas, toxoplasmose e malária, por exemplo, são de desenvolvimento complexo e normalmente dificilmente apresentam uma eficácia acima de 50%. Os protozoários, apesar de terem apenas uma célula, são complexos. Portanto, é difícil criar um imunizante capaz de impedir a contaminação. No entanto, uma infecção mais branda pode possibilitar que o sistema imune consiga controlar os parasitos e impedir a doença —afirma Bergmann.
MOSQUITO A leishmaniose visceral é uma doença causada pelo protozoário Leishmania chagasi que acomete não apenas cães, mas também humanos. O vetor mais comum no Brasil é o inseto conhecido como mosquito palha, que pode transmitir a doença tanto de cachorro para cachorro quanto do animal para pessoas. Nos cães, a doença provoca feridas na pele nas quais há presença do protozoário, facilitando a contaminação do inseto e a transmissão para outros animais ou para humanos. Quando não tratada, a doença em humanos pode levar à morte em até 90 % dos casos, segundo dados do Ministério da Saúde. Em média, cerca de 3.500 novos casos em humanos são registrados anualmente no Brasil.
Um estudo de revisão publicado por pesquisadores da Universidade Federal de Sergipe na revista científica Science and Animal Health mostra que os casos de leishmaniose visceral canina vêm aumentando no Brasil nos últimos anos e a prevalência varia de 4% a 75%, dependendo da região do país.
Antes vista apenas nas áreas rurais, nos últimos anos a doença em humanos avançou para as cidades devido à maior adaptação e dispersão do vetor ao ambiente urbano e ao abandono de animais na rua. Há casos em praticamente todas as regiões do país, no entanto a infecção é considerada endêmica em estados do Nordeste e do Centro-Oeste.
Para humanos, há tratamento gratuito distribuído pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Já para os cães, o tratamento é longo, de alto custo e nem sempre eficaz contra a doença, provocando a morte do animal.

Fonte:  O Globo