Santuários de Humanidade

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha regularmente contrata profissionais de Saúde para atender vítimas em conflitos armados. Para mais informações, visite o site da entidade

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Um carro passa sacolejando em uma estrada empoeirada. Estamos evacuando um jovem que agoniza no banco de trás. Diminuímos a velocidade, à medida que nos aproximamos de um posto de controle, onde militares portam fuzis AK-47. De dentro do veículo do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, que está logo atrás de um outro, prendo a respiração e observo a cena. O motorista aponta para o banco de trás e eu o escuto gritar: ‘Keysaney’. Os nossos carros são liberados sem que se dissesse mais nada.

Em 1991, a Somália viveu uma guerra civil generalizada. Para responder às necessidades cada vez maiores na área de Saúde, o Crescente Vermelho Somali e o CICV transformaram um presídio recém-construído em um hospital cirúrgico: Keysaney. Ajudei os colegas a estabelecerem protocolos clínicos e administrativos, além de treiná-los em técnicas de cirurgia de guerra e enfermagem. O que conseguimos criar foi não só um hospital, mas um verdadeiro santuário de HUMANIDADE.

Nossos pacientes vinham de diferentes clãs que lutavam entre si. Ainda assim, todos eram tratados apenas com base nas suas necessidades médicas. Como Keysaney era o melhor (e muitas vezes o único) hospital cirúrgico no país, pacientes de toda a Somália eram transferidos para lá também. A NEUTRALIDADE do hospital era tão respeitada que até mesmo a estrada para lá era considerada neutra.

No entanto, esta situação parece excepcional hoje. Entre 2012 e 2014, em apenas 11 países, o CICV documentou quase 2,4 mil ataques contra pacientes e profissionais, estabelecimentos e veículos de Saúde. Do Afeganistão à República Centro-Africana, do Sudão do Sul ao Iêmen, eles foram bombardeados, saqueados, incendiados e destruídos. Pacientes foram mortos nos seus leitos; profissionais de Saúde foram atacados enquanto resgatavam feridos.

O impacto imediato é claro: os pacientes são privados de atendimento e as equipes de Saúde de prestar os seus serviços. Isso resulta em um número maior de vítimas civis: não somente mais mortos e feridos, mas também mais doenças e deficiências físicas e mentais. O impacto no longo prazo também é crítico. Pode levar ao êxodo de profissionais de Saúde, à destruição ou ao fechamento de estabelecimentos e, por conseguinte, à disrupção do sistema de assistência à saúde.

O impacto imediato é claro: os pacientes são privados de atendimento e as equipes de Saúde de prestar os seus serviços. Isso resulta em um número maior de vítimas civis: não somente mais mortos e feridos, mas também mais doenças e deficiências físicas e mentais. O impacto no longo prazo também é crítico. Pode levar ao êxodo de profissionais de Saúde, à destruição ou ao fechamento de estabelecimentos e, por conseguinte, à disrupção do sistema de assistência à saúde.

Em 2011, lançamos “Assistência à Saúde em Perigo”, uma iniciativa que visa melhorar a eficiência e a prestação efetiva e imparcial de assistência à saúde. Apresenta recomendações para informar o avanço de políticas e a implementação de medidas para aumentar o respeito pelos serviços de assistência à saúde, assegurando sua proteção.

Há mais de 150 anos, as Convenções de Genebra estabeleceram limites claros para as guerras. Segundo eles, os profissionais de Saúde podem prestar serviços de maneira imparcial a todos os doentes e feridos, independente de afiliação política ou de outra natureza. Precisamos trabalhar para que isso seja a regra, não a exceção.

Christos Giannou, cirurgião de guerra que fez várias missões para o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), em países como Somália, Jordânia e Egito

Publicado na Revista da APM – Edição 680 – agosto 2016

Por: Christos Giannou