“O que causa a inflamação? O que inicia esse processo e o que o mantém ativo?” Essas perguntas abriram uma das palestras mais instigantes do Congresso Europeu de Oncologia (ESMO 2025) e tocam em um ponto central da oncologia moderna: o papel da inflamação crônica no desenvolvimento e na progressão do câncer.
Durante a apresentação, foram mostradas evidências robustas ligando a inflamação persistente a alterações celulares que favorecem o surgimento e a evolução dos tumores. Exemplos concretos ajudam a compreender essa relação: a bactéria Helicobacter pylori, responsável por inflamações crônicas no estômago, está associada ao desenvolvimento do câncer gástrico; já o vírus das hepatites B e C, que provoca inflamação prolongada no fígado, aumenta o risco de câncer hepático.
A inflamação é uma resposta natural do organismo, um mecanismo de defesa diante de lesões, infecções ou agressões externas. No entanto, quando se torna crônica ou contínua, deixa de proteger e passa a favorecer o crescimento de células doentes.
Isso não significa, necessariamente, que a inflamação seja a causa do aparecimento das células cancerígenas. Na verdade, ela atua como um fator promotor, criando um ambiente propício para que essas células cresçam, se multipliquem e se tornem mais resistentes. É como se a inflamação preparasse o terreno para o desenvolvimento da doença.
Essa compreensão muda a forma como olhamos para o câncer. Não se trata apenas de tratar o tumor, mas também de entender e controlar os processos inflamatórios que o alimentam.
O que deixa o corpo inflamado e como evitar esse processo?
Diversos fatores podem manter o corpo em um estado de inflamação contínua. O excesso de gordura corporal, por exemplo, libera substâncias inflamatórias que prejudicam o metabolismo e o sistema imunológico. Mas há outros elementos igualmente importantes: infecções não tratadas, feridas que não cicatrizam, doenças crônicas e até o estresse prolongado contribuem para um ambiente inflamatório que favorece o desenvolvimento de doenças.
Por isso, combater a inflamação é um passo essencial na prevenção do câncer e de outras doenças crônicas. Estratégias simples, mas eficazes, fazem diferença: praticar atividade física regularmente, adotar uma alimentação equilibrada e anti-inflamatória, manter um sono reparador e buscar o controle de condições que causam dor ou infecção persistente. Não há um único caminho nesse sentido – muito menos soluções mágicas.
Além da combinação de medidas de estilo de vida, novas terapias vêm sendo estudadas para modular os processos inflamatórios. Medicamentos que atuam em moléculas específicas (como a leucina e outros agentes) têm mostrado potencial para reduzir a inflamação em tecidos e órgãos e, com isso, diminuir o risco de progressão de doenças relacionadas.
O desafio agora é entender como interromper a inflamação antes que ela cause danos irreversíveis e como transformar esse conhecimento em estratégias práticas de cuidado, capazes de proteger a saúde das pessoas de forma integral.
Compreender o microambiente inflamatório tumoral é um dos caminhos mais promissores para desenvolver tratamentos mais eficazes e, principalmente, estratégias de prevenção mais inteligentes.
Fonte: Estadão – acesse aqui