A realidade da formação médica

Leandro Freitas Colturato, diretor da 8ª Distrital da APM, traz dados alarmantes sobre o tema

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Com um contingente de mais de 640 mil médicos, o Brasil egressa anualmente 35 mil novos profissionais no mercado de trabalho. Com uma média de 3 médicos por mil habitantes, índice que dobrou desde 2013, há uma assimetria impactante na distribuição: DF, com 6,28 médicos por mil habitantes, versus Maranhão, com 1,27. A previsão para 2035 é de 5,2 médicos por mil habitantes (1.152.239 médicos).

Com incríveis 472 escolas médicas, 225 abertas de 2014 a 2024, destas 92% privadas, ficamos no topo do mundo, atrás apenas da Índia. Com um total de 48.491 vagas/ano (79,3% privadas), 95 escolas para abrir e 177 judicializadas, o futuro médico assistencial é sombrio.

A abertura desenfreada de faculdades não segue roteiro que respeita a qualificação da formação médica. Não há recursos e nem estrutura suficiente para uma avaliação adequada dos formandos, muito menos para a expansão de novas escolas médicas.

O agravante continua. A residência médica (RM), essencial para melhorar, complementar e especializar a formação médica, não acompanha a graduação; foram 32.611 graduados em 2023 para 16.189 vagas de acesso direto à RM em 2024.

E na falta de vagas na RM, cursos de especialização crescem e preocupam. O interesse dos conglomerados educacionais na Medicina é grande, pois constitui negócio altamente lucrativo, principalmente nos cursos com menor duração e em formato de EAD.

Os dados são assustadores. Em 2017, foi estimada uma mortalidade geral intra-hospitalar de 782.648 pessoas. Destas, 54.769 (7%) por eventos adversos graves, sendo 34.174 (4,6%) de mortalidade evitável por eventos adversos; incríveis 4 óbitos evitáveis/hora. Em 2023, o Brasil registrou 25 mil processos por danos materiais ou morais decorrentes da prestação de serviços de Saúde, uma alta de 35% em relação a 2020.

A Associação Paulista de Medicina tem a defesa do bom exercício profissional e a assistência digna à população como pilares. O futuro da formação especializada passará pela preservação e expansão da RM (desde que a capacidade e a qualidade dos programas sejam adequadamente avaliadas), pelo reconhecimento do papel das sociedades de especialidades na titulação e certificação de especialistas e pela fiscalização rigorosa dos cursos de pós-graduação lato sensu em Medicina.

A qualidade e a competência jamais podem ser presumidas. Elas, obrigatoriamente, têm que ser comprovadas.

Leandro Freitas Colturato, ginecologista e obstetra e diretor da 8ª Distrital da APM (CRM-SP 120.707 | RQE-SP 98.689)