Gazeta do Povo divulga artigo do diretor da APM

Clóvis Francisco Constantino aborda os danos invisíveis do clima extremo sobre as crianças

APM na imprensa

Há alguns anos ecoaria com normalidade refutar previsões de catástrofes ambientais. Infelizmente, esse tempo acabou e os efeitos negativos do clima extremos impactam a qualidade de vida de todos, sobretudo de crianças e adolescentes. Um exemplo claro das mudanças climáticas é apresentado pelo relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef): eventos climáticos deixaram 1,7 milhão de alunos brasileiros sem aulas em 2024.

Este ano, o cenário não é muito diferente. Cerca de 700 mil alunos da rede pública de ensino do Rio Grande do Sul não puderam retornar às aulas. O motivo? A onda de calor extremo. Os termômetros bateram 40º graus e a sensação térmica em alguns lugares atingiu quase 50º. Não podemos nos esquecer que, no ano passado, parte dessas crianças e adolescentes sentiu na pele os danos provocados pelas enchentes e pelo clima extremo.

Não há como negar: a crise climática que enfrentamos hoje é resultado direto das nossas ações sobre a natureza. Emissões de gases decorrentes de incêndios florestais, como os que assolaram vários estados brasileiros em 2024; da queima de combustíveis fósseis; das indústrias; e de outras atividades humanas têm aumentado a temperatura do planeta de forma acelerada, colocando em xeque o nosso estilo de vida. Assim, evidencia-se a urgência de uma ação coletiva e consciente sobre o meio ambiente, que envolva a todos. 

Além disso, é preciso pensar em como fica a saúde psíquica dessa população após passar uma tragédia de tamanha magnitude. Muitos presenciaram perdas materiais, afetivas e até o falecimento de parentes e pessoas próximas. Como fazer uma criança e/ou um adolescente voltar à normalidade após algo assim? Como explicar para eles que talvez tenham que se acostumar a isso?

“É hora de unirmos forças para (re)construir um mundo mais digno, menos poluído e mais saudável para nossas crianças e adolescentes. A mudança que queremos para nossos filhos e netos precisa começar agora, pois só assim vamos conseguir construir uma nova consciência ambiental”

Neste contexto, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) tem se mobilizado para sensibilizar pediatras, educadores e a população sobre a importância da natureza e do clima para o desenvolvimento pleno de crianças e adolescentes. O contato com áreas verdes não é apenas esteticamente agradável, mas fundamental para o crescimento infantil e o processo de descoberta do mundo.

Atividades ao ar livre incentivam um estilo de vida mais ativo e menos dependente das telas, além de fortalecerem os vínculos familiares. Para que uma criança saiba da importância da natureza é primordial que a escola fale sobre o tema. Da mesma forma, em casa, os pais precisam adotar um novo estilo de vida, colocando em prática o que é ensinado em sala de aula, como separar corretamente os resíduos, investir em uma alimentação mais saudável e consumir de um jeito mais consciente.

O exemplo diário tem uma força imensa na formação de uma nova consciência ambiental. Neste aspecto, o documentário A Conspiração Consumista deixa claro a importância das nossas escolhas e ressalta que não existe “jogar fora”, o que existe é um ecossistema do qual fazemos parte.

A discussão sobre esse tema deve ser constante, abrangendo todas as esferas da sociedade. Inclusive, a SBP incentiva os pediatras a abordarem a temática ambiental e sobre o clima em suas consultas, reforçando para os pais e responsáveis pelas crianças a importância de sua participação na construção de um futuro sustentável para as próximas gerações.

Por fim, deixo aqui uma reflexão para pais, cuidadores, pediatras e educadores das nossas crianças: o que estamos fazendo, como sociedade civil, para mitigar os efeitos do aquecimento global e clima extremo? Como estamos discutindo o tema com nossos filhos? Temos pressionado o suficiente para que o poder público adote medidas eficazes? E nós, o que temos feito? Estamos separando nosso lixo? Quando algo quebra, consertamos ou “jogamos fora”? Descartamos remédios, pilhas e lâmpadas nos pontos de coleta ou mandamos tudo para o aterro? Quando vamos tomar um suco ainda pedimos canudo de plástico?

É hora de unirmos forças para (re)construir um mundo mais digno, menos poluído e mais saudável para nossas crianças e adolescentes. A mudança que queremos para nossos filhos e netos precisa começar agora, pois só assim vamos conseguir construir uma nova consciência ambiental. Não adianta lixeira se insistirmos em jogar detritos na rua. A consciência precisa vir antes. Como bem disse o grande dramaturgo Victor Hugo: “É triste pensar que a natureza fala e que o gênero humano não a ouve”.

Confira o texto na íntegra neste link

Clóvis Francisco Constantino é diretor de Previdência e Mutualismo Adjunto da Associação Paulista de Medicina, presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria e professor de Ética Médica e Bioética.

Fonte: Gazeta do Povo