Guido Palomba comenta emissão de receitas amarelas e azuis de forma digital

Renomado psiquiatra forense e diretor Cultural da APM faz alertas importantes sobre a decisão da Anvisa

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Causou surpresa o anúncio da liberação da receita digital azul [e amarela] para médicos no Brasil. Relembre-se que é um documento usado para prescrição de psicotrópicos, entre eles os barbitúricos e os anorexígenos, os quais exigem controle da Anvisa e das farmácias, ficando a receita retida quando o paciente vai comprar a droga.

A quantidade máxima permitida é para até 30 dias, considerando a necessidade de vigilância e controle das substâncias receitadas. Vários remédios psiquiátricos estão inseridos nessa categoria, que é regida pela Portaria do Ministério da Saúde 344/1998. Tal medida, obviamente, visa à segurança do paciente, evitando potencial abuso, efeitos colaterais, dependência físico-psíquica etc.

A Anvisa, no dia 10 de dezembro, modificou a referida Portaria, aprovando a emissão dessas receitas azuis digitalmente, como se isso fosse evolução, ou seja, modernização do processo. Porém, se facilita a compra do remédio e o acesso à droga controlada, por outro lado diminui, e até abole, o reexame presencial do paciente, absolutamente necessário quando o médico está diante de situação presumidamente delicada, na qual estão envolvidos transtornos mentais de, no mínimo, certa gravidade (do contrário, não seriam receitados psicotrópicos).

Também estão envolvidas as próprias substâncias que serão digitalmente liberadas, a maioria causadora de dependência psíquica e física. Observe-se que os efeitos benéficos dessas drogas, bem como os colaterais, precisam ser criteriosamente ponderados, ajustados caso a caso, conforme a evolução da moléstia, a aceitação psíquica e física do paciente e todas as demais circunstâncias que envolvem cada indivíduo em particular.

A liberação pela Anvisa da receita digital azul, ao facilitar a compra de psicotrópicos, vai no sentido inverso da atenção à Saúde pois, em vez de dificultar o acesso a drogas que modificam o psiquismo, desobriga procedimentos fundamentais, por exemplo, os que envolvem o contato do médico com o paciente.

Fotos: Jacqueline Spotto/Anvisa | Arquivo pessoal

Guido Arturo Palomba, psiquiatra forense, diretor Cultural adjunto da Associação Paulista de Medicina e membro emérito da Academia de Medicina de São Paulo