História da Academia Cristã de Letras é relatada em Tertúlia Acadêmica da AMSP

Como de costume, a Academia de Medicina de São Paulo realizou - na segunda quarta-feira do mês - a sua tradicional Tertúlia Acadêmica. Na edição de novembro, realizada no dia 9, a palestra contou com o tema “Academia Cristã de Letras – Passado e Presente”

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Como de costume, a Academia de Medicina de São Paulo realizou – na segunda quarta-feira do mês – a sua tradicional Tertúlia Acadêmica. Na edição de novembro, realizada no dia 9, a palestra contou com o tema “Academia Cristã de Letras – Passado e Presente”, tendo o acadêmico e vice-presidente da AMSP, Hélio Begliomini, como apresentador e palestrante.

Begliomini, que também é presidente da Academia Cristã de Letras, explicou que seu objetivo era fornecer uma visão geral sobre a instituição, sua história e os motivos pelos quais a fazem ser tão ativa nos âmbitos culturais, artísticos e sociais. A apresentação foi iniciada através da frase do filósofo dinamarquês Søren Aabye Kierkegaard: “A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas só pode ser vivida olhando-se para frente” – de modo que, de acordo com o palestrante, a citação pode ser aplicada na vida pessoal de cada um dos indivíduos.

Com este pensamento, Begliomini aproveitou para homenagear o médico húngaro György Miklós Bohm, estabelecido no Brasil durante muitos anos, grande intelectual, conhecedor das óperas, introdutor da disciplina de Informática Médica na graduação – a primeira do País –, autor de importantes obras e responsável por ministrar uma das edições da Tertúlia Acadêmica em outubro de 2021, quando o evento retornou às atividades presenciais.

Bohm faleceu no último dia 18 de outubro, no Dia do Médico, deixando um grande legado para a profissão.

Academia Cristã de Letras

Foi no dia 14 de abril de 1967, às 20 horas de uma sexta-feira, que um núcleo notável de intelectuais, professores e poetas oficializaram a fundação da Academia Cristã de Letras (ACL). Sua sede, localizada no Clube Piratininga, reunia os idealizadores do projeto, que se dividiam entre Bernardo Pedroso, Afonso Vicente Ferreira, Nicola de Stefano e Antonio Lafayette Natividade Silva – este, o único fundador da entidade ainda vivo.

Por volta de sete anos depois da fundação, foi proposto que, por ser uma Academia, deveria possuir um patrono, ao passo que, em uma decisão unânime, foi escolhido o nome de São Francisco de Assis. O santo, habitualmente conhecido por ser padroeiro dos animais, foi escolhido por sua importância nas mais diferentes matrizes religiosas, por sua simpatia, popularidade e relação com a natureza.

Em 1982, durante a gestão de Alcindo Brito enquanto presidente, a Academia Cristã de Letras conseguiu alcançar o certificado de Utilidade Pública Municipal. Dois anos depois, através da deputada estadual Dulce Salles Cunha Braga, a ACL foi reconhecida com o certificado de Utilidade Pública Estadual, através da Lei Estadual nº 1.163, sancionada pelo então governador do estado de São Paulo Paulo Egydio Martins. Em uma grande coincidência, posteriormente Dulce seria eleita a 3ª ocupante da cadeira de número 17 na Academia.

Dentre as insígnias da ACL, a mais antiga é uma faixa com uma roseta que remete a uma faixa presidencial. As cores escolhidas foram especialmente pensadas por conta da representação que trazem consigo. O amarelo, por simbolizar a intelectualidade, e o vermelho por representar a plena espiritualidade que todo ser humano aspira.

Todavia, 10 anos após a fundação da Academia, os membros sugeriram que a entidade precisava de um símbolo para caracterizá-la. A tarefa de desenvolver o emblema da instituição foi passada para Biaggio Mazzeo, que criou uma figura que remete a um sol estilizado, acompanhado por ondas que se originam na parte inferior e escura, atingindo a parte alta do desenho – dando a impressão do reflexo solar.

“O sol foi pensado pois ele é a claridade, a energia, a vida. Na parte inferior, esses semicírculos são as ondas, em que vemos um trecho da Oração da Paz, de São Francisco de Assis, em que é dito ‘onde haja trevas, que eu leve luz’; enquanto acima, podemos observar o nome da Academia, e há ainda o círculo interno, simbolizando os alvos a serem atingidos. O emblema foi usado pela primeira vez em 4 de outubro de 1977, em um carimbo postal emitido pelo Correio, em comemoração ao Dia do Poeta – instituído pela ACL”, relembrou o palestrante.

Neste contexto, em 1979, o acadêmico Geraldo Dutra coordenou um projeto que visava o desenvolvimento de uma medalha com faixas nas cores amarela e vermelha como a mais nova insígnia da instituição para os membros vitalícios. Elas passaram a ser entregues para os acadêmicos a partir de setembro do mesmo ano, de modo que a confecção foi realizada pelo escultor Luiz Morrone.

“Na gestão de Adolfo Lemes Gilioli, quando a Academia completou cinco anos, o nosso símbolo que, originalmente, era preto e branco, passou a ser colorido. Gilioli confeccionou pins coloridos, os distribuindo para todos os membros da entidade, e acabou ficando com essa ideia. Há aproximadamente dois ou três anos, membros da ACL cogitaram a possibilidade de tornar oficialmente o nosso emblema em algo colorido, e através de reuniões da Diretoria e Assembleias, o nosso símbolo passou, de fato, a ter cores”, explicou Begliomini.

Fortalecimento

Uma das principais lutas da Academia Cristã de Letras durante o seu processo de consolidação foi por uma sede própria, abrangendo a documentação e um espaço físico pertencente à instituição. Neste sentido, algo inesperado aconteceu por volta de abril de 1979, quando uma ligação telefônica ao então presidente Alcindo Brito indicou que havia uma pessoa interessada em realizar a doação de um imóvel localizado no bairro de Campos Elíseos, em São Paulo. A transação aconteceu e a condução da transferência do imóvel foi realizada pelo acadêmico Hélio Falchi.

Ao longo de seus 55 anos de existência, a entidade teve 17 presidentes, sendo que alguns deles foram médicos: José Pedro Leite Cordeiro; Duílio Crispim Farina, grande nome da história médica e forte atuante da Associação Paulista de Medicina, local em que atuou como diretor Cultural e fundou a Biblioteca da entidade; Afiz Sadi; e Yvonne Capuano, primeira mulher a presidir a ACL.

Begliomini também salientou que, para comemorar os 40 anos de existência da Academia Cristã de Letras, publicou um livro sobre a instituição, em que relembra toda a sua trajetória e feitos históricos. Já em dezembro de 2015, durante a gestão do então presidente Paulo Nathanael Pereira de Souza, a instituição foi condecorada com um memorial em que se encontram biografias de todos os seus membros.

“Toda entidade tem um juramento de posse, e em 2020 a nossa Diretoria resolveu criar um juramento mais incisivo, para que as pessoas se comprometessem ainda mais a trabalhar pela Academia, possibilitando que ela se torne cada vez maior e melhor. Além disso, nos últimos anos foram realizados diversos projetos que visam aprimorar a ACL, como o desenvolvimento de uma revista em que eram publicados artigos para os acadêmicos, a criação de um boletim, além da publicação de um opúsculo com discurso de saudação e palavras do presidente para todos aqueles que adentrarem à entidade”, descreveu o atual presidente.

Além disso, com o passar dos anos e o avanço da tecnologia, os acadêmicos começaram a ansiar para que a ACL pudesse ter um espaço na internet, vitória alcançada pelo presidente Ruy Martins Altenfelder Silva, possibilitando a criação do site que, conforme indicou o palestrante, é riquíssimo de informações históricas e culturais, para que quem acessar possa conferir biografias, artigos e diferentes notícias.

Composição

“O maior patrimônio que temos na Academia não é o físico, mas sim os nossos membros. Seguimos os moldes da Academia Francesa, com 40 cadeiras, das quais 35 são patronos e cinco são patroneses. É interessante ressaltar que dos nossos patronos, apenas 13 são de religiosos ou santos. Isso porque é prerrogativa àquele que está ocupando a cadeira pela primeira vez escolher o seu próprio patrono, de modo que nem todos optaram por alguém ligado à religiosidade. Nós somos uma academia cristã, mas é no sentido de que seus participantes se identificam com essa filosofia, pois procuramos manter os nossos debates sempre de forma respeitosa”, esclareceu.

Dos patronos que constituem a ACL, estão marcantes nomes como Machado de Assis, Castro Alves, Cecília Meireles, além de nomes ocupados por santos famosos no cristianismo, como Santo Agostinho, São Paulo e São José, por exemplo. Curiosamente, das 40 cadeiras, cinco delas possuem patronos médicos, sendo eles José Martins Fontes, Miguel de Oliveira Couto, Sigmund Freud, São Lucas e o ex-presidente do Brasil Juscelino Kubitschek.

Não obstante, a Academia Cristã de Letras abre suas portas para receber acadêmicos das mais variadas profissões, o que permite observar o contexto da riqueza humana que constitui a entidade. Os membros da ACL são militares, teatrólogos, cineastas, artistas plásticos, religiosos, professores, advogados – profissão que mais aparece em diferentes academias -, jornalistas, historiadores e uma série de magistrados, desembargadores e diplomatas.

Durante o tempo de atuação da Academia, houve a presença de 125 intelectuais, sendo que destes, 23 deles foram médicos, totalizando 18,6%. Dentre os nomes marcantes, encontram-se diretores da Associação Paulista de Medicina, como o presidente, José Luiz Gomes do Amaral; o 4º vice-presidente, Luiz Eugênio Garcez Leme; e o diretor Cultural, Guido Arturo Palomba.

“Às vezes, não consigo imaginar que cheguei tão longe, jamais poderia pensar que estaria ao lado de tantos profissionais brilhantes. Olhem como é o destino, a primeira vez que decidi me candidatar à ACL, não fui eleito, mas hoje sou o presidente. Falo isso porque sinto que algumas vezes as pessoas não são eleitas e, por orgulho, não se candidatam novamente, o que é uma grande perda. Se tem um motivo pelo qual gosto de participar de tertúlias e de Academias é porque esses núcleos reúnem pessoas do mais elevado nível profissional. Por isso, faço questão de estar presente, pois saímos fartos de alegria, cultura e conhecimento”, finalizou Begliomini.

Texto: Julia Rohrer

Fotos: Marina Bustos